Altera o Código Penal para prever a possibilidade de perdão da execução da pena na hipótese que especifica.
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º O art. 110 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, passa a vigorar acrescido dos seguintes §§ 3º e 4º:
Prescrição depois de transitar em julgado sentença final condenatória “Art. 110. ………………………………………..
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§ 3º Na hipótese do caput, transcorrido lapso igual ou superior a dois terços do prazo previsto para a prescrição sem que haja causas mterruptivas ou suspensivas, o juiz poderá deixar de executar a pena se o condenado não tiver praticado nenhum crime no correspondente período e sua conduta social, ocupação,
antecedentes e outras circunstâncias recomendarem a extinção da pena.
§ 4º O perdão de que trata o parágrafo anterior não se aplica às condenações por crimes hediondos ou com pena privativa da liberdade superior a dez anos. (NR)”
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Justificação
A presente proposição move-se, antes de tudo, por um princípio de justiça social. Ocorre, muitas vezes, que a pena fixada na condenação perde a sua
relevância se não for imediatamente aplicada, e, não só a sua relevância, mas a sua necessidade, sobretudo quando o condenado mostra-se perfeitamente
integrado ao meio social em que vive, exercendo ocupação lícita, sem qualquer envolvimento com atividades criminosas. O perdão – gesto que funda o cristianismo – não é um instrumento estranho à justiça penal. Ao contrário, devemos entender que o poder-dever de punir recebe mitigações de todos os poderes da República, ou seja, do Executivo, do Legislativo e do Judiciário que podem, em certos casos, perdoar o condenado, aliviando-o do cumprimento da pena privativa de liberdade.
Nesse sentido, o Poder Legislativo dispõe da competência para conceder anistia, nos termos do art. 48, VIII, da Constituição Federal (CF); o art. 84, XII, da
CF confere ao Presidente da República a competência privativa para “conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos
em lei”, ressalvado o disposto no inciso XLIII do art. 5º, e, finalmente, o Poder Judiciário, nas hipóteses expressamente previstas na legislação, pode conceder
o “perdão judicial” (arts. 107, IX, 120, 121, § 5º, 140, § lº, 168-A, § 3º, 176, parágrafo único, 180, § 5º, 240, § 4º, 242, parágrafo único, 249, § 2º, 337-A, § 2º, todos do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, bem como o art. 13 da Lei nº 9.807, de 13 de julho de 1999, que dispõe sobre a colaboração para a investigação criminal).
Partimos do pressuposto de que, em muitas situações, embora o cidadão tenha infringido a legislação penal, sua conduta deixou de ser socialmente reprovada,
ou a própria pena perdido sua utilidade. A situação oposta – ou seja, não acolher a possibilidade de perdão ou mitigação da pena – pode gerar situações de injustiça extrema. A presente proposição estabelece, pois, uma nova modalidade de perdão judicial que opera sobre a execução da pena. Assim, o juiz poderá extinguir a pena imposta quando reunidos os seguintes requisitos:
a) transcorrido lapso equivalente a dois terços do período em que ocorreria a prescrição integral depois do trânsito em julgado, desde que não intervenham
causas interruptivas ou suspensivas;
b) a extinção da pena seja recomendável tendo em vista a conduta social (auto-ressocialização do condenado), exercício
regular de trabalho remunerado, constituição de família, antecedentes e outras circunstâncias, como as previstas, p. ex., no art. 94 do Código Penal. Como
é da natureza do perdão judicial, tal medida constitui uma faculdade do magistrado, e não um direito subjetivo do condenado. Com base no caso concreto, o juiz deverá ponderar todas aquelas condições para verificar se a execução da pena ou sua continuidade é a medida adequada, necessária e proporcional, principalmente em face da finalidade de reinserção social do condenado, consagrada no art. 1º da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 – Lei de Execução Penal, e no art. 5º da Convenção Americana sobre os Direitos Humanos – Pacto de São José da Costa Rica, incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro por meio do Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992.
Não somos movidos – tenha-se claro – por qualquer sentimento de liberalidade, mas apenas pelos critérios de justiça e de razoabilidade quanto às finalidades
da lei penal. Ora, passado um período juridicamente relevante (tanto é que muito próximo ao período em que ocorreria, por inteiro, a prescrição!), e apresentando o condenado boa conduta social, trabalho regular e antecedentes favoráveis, é razoável que se deixe o juiz decidir sobre a necessidade do
prosseguimento da execução penal. Seria uma enorme hipocrisia ignorar a situação caótica do sistema prisional brasileiro e suas influências nefastas sobre a
pessoa do condenado, tanto pelas condições aviltantes da prisão como pela cooptação de grupos de internos, fatores que reduzem invariavelmente os horizontes da sua ressocialização.
Registre-se, finalmente, que tomamos o devido cuidado para que a proposta não venha beneficiar os condenados por crimes hediondos ou aqueles que
receberam pena superior a dez anos. Com isso, entendemos que o perdão da execução da pena ficará restrito a hipóteses bastante razoáveis.
Sala das Sessões, 3 de junho de 2005. – Senador
Marcelo Crivella.