O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL – RJ. Como Líder. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, começo com uma indagação: a que se deve a imensa repercussão e o clima de crise política relacionados à declaração do Presidente Lula no Espírito Santo, interpretada como confissão de acobertamento por delitos acontecidos no Governo anterior?
Ora, se o Presidente se referia ao BNDES, como a imprensa deduziu, em realidade Sua Excelência tinha em vista o empréstimo da AES, empresa americana, Sr. Presidente, que decidiu não pagar, e, na verdade, postergar indefinidamente o empréstimo com que privatizou a Eletropaulo, o que representaria um prejuízo bilionário para o BNDES, obrigando-o a registrar, na mesma época, um déficit no banco que, se não fosse o aporte de dinheiro público por emergência, isso sim faria com que esse banco de fomento quebrasse.
O então Presidente do BNDES, Carlos Lessa, foi brilhante e fez uma negociação. Ele recuperou os créditos que o banco tinha com essa companhia e, no final de 2003, o banco fechou com lucro. Aliás, lucro recorde na sua história. Obviamente, não se pode chamar a isso de acobertamento de corrupção. Acredito que recomendar a um auxiliar que não é membro do Ministério Público ou da Polícia Federal que não se pronuncie a respeito de um fato ainda não apurado é dar o encaminhamento correto à questão.
Sr. Presidente, como homem público, analisando o processo de desestatização das nossas empresas, farei uma pequena retrospectiva histórica.
Quero falar da história e não dos personagens, e essa distinção é crucial. Tenho imensas restrições ao programa de privatização brasileiro, mas tremo ao pensar que a culpa por seus erros é partilhada por ninguém menos que o próprio Congresso Nacional!
Temos que distinguir entre a aprovação congressual do programa de privatização e sua operação prática pelo Executivo.
Mas em que nível de decisão se situa o descalabro que foi a privatização das telecomunicações, das ferrovias, da petroquímica e, ainda no Governo Collor, da própria siderurgia?
Por que o Congresso Nacional não exigiu uma aprovação à inglesa, que impôs a pulverização das ações de controle e o rigor na regulamentação dos monopólios e oligopólios oriundos da privatização?
Por que o Congresso deixou que as tarifas de empresas de serviço privatizadas continuassem e continuem indexadas, sendo hoje o principal fator de inflação remanescente na economia?
Apenas um exemplo: a siderurgia oligopolizada, que resultou da privatização, impôs este ano à economia um aumento de mais de 80%. Um monopólio público se tornou um monopólio privado sem controle. E de quem é a culpa? Do Executivo ou do Congresso? Ou será de ambos?
Não menciono, Srªs e Srs. Senadores, casos específicos de corrupção no processo de privatização. Provavelmente existem, mas é preciso identificá-los para dar início a um procedimento investigatório. Precisamos rever o sistema como um todo.
Por isso, Sr. Presidente, resolvi propor ao Presidente da República que crie, por decreto presidencial, a Comissão de Revisão do Programa Nacional de Desestatização na forma de um decreto que apresento agora.

1.   Fica instituída a Comissão Especial de Investigação do Programa Nacional de Desestatização, com a incumbência de proceder, em seis meses, amplo levantamento sobre a condução e execução do Programa Nacional de Desestatização, a partir de sua criação em 1991, com enfoque em seus aspectos operacionais de eficiência e funcionalidade econômicas, interesse público e ética.
(…)
2.   A Comissão Especial de Investigação Nacional de Desestatização terá o suporte técnico do BNDES e a prerrogativa de requerer dos órgãos públicos, no menor prazo legal, toda informação e documentação relevantes para o desempenho de suas finalidades.
3.  A Comissão Especial de Investigação do Programa Nacional de Desestatização poderá requisitar funcionários públicos da administração direta e indireta para formar sua assessoria econômica e jurídica, assim como contratar assessoria econômica e jurídica durante o período de sua duração.
4.  O relatório conclusivo da Comissão conterá, obrigatoriamente: a) uma avaliação abrangente do Programa Nacional de Desestatização, em seus diferentes subsetores, quanto ao aspecto de funcionalidade e eficiência econômica, sugerindo procedimentos para corrigir eventuais falhas constatadas; b) em caso de constatação de indício de desvios e quebra de ética na condução de projetos específicos de privatização, uma recomendação explícita para que o Presidente da República acione o Ministério Público Federal e proceda a devida apuração e a eventual punição dos culpados”..

Assim, fica claro para a opinião pública que nem o Presidente Fernando Henrique Cardoso tem algo a esconder nem o Presidente Lula se nega a investigar.
Sr. Presidente, concluirei fazendo referência a uma conta que não é compreendida por nenhum brasileiro. Em 1991, iniciou-se o processo de venda das empresas estatais, tendo-se arrecadado US$90 bilhões. Aliás, chamo a atenção dos nossos telespectadores, que nos honram com a sua audiência por meio da TV Senado e também da Rádio Senado.
O processo de desestatização começou em 1991. Os US$ 90 bilhões então arrecadados equivalem hoje a R$270 bilhões. Naquela época, a nossa taxa tributária estava em torno de 27%. Atualmente, segundo os especialistas, é 37% – ou seja, 10% a mais. A números do PIB de hoje de R$1,5 trilhão, seriam mais R$150 bilhões.
Nesse período, aumentaram-se os impostos. Somando-se aqueles R$150 bilhões aos R$270 bilhões, seriam R$420 bilhões. Acontece, Sr. Presidente, que a nossa dívida interna era R$300 bilhões. No fim do ano passado, ela alcançou R$1 trilhão, aumentando-se, portanto, mais R$700 bilhões. Este valor somado a R$420 bilhões equivale a mais de R$1 trilhão.
Sr. Presidente, onde está esse dinheiro? Onde está o montante arrecadado da venda das estatais e do aumento dos impostos se a dívida cresceu tanto? Essa é a conta que a Nação Brasileira pretende entender.