O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ. Como Líder. Sem revisão do orador.) –Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos todos estarrecidos. As notícias que chegam do Rio são de estraçalhar o coração. As mães velaram seus filhos esta noite e foram sepultá-los agora de manhã, e outras crianças serão sepultadas à tarde.
Quero chamar atenção, Senador Cristovam Buarque, para dois aspectos.
Fui visitar, a pedido, o maníaco do parque. O que me disse esse homem condenado a trezentos anos de cadeia num presídio em Avaré, onde há mil estupradores e pedófilos, só estupradores e pedófilos? Ele me disse que se escondia nas matas dos parques de São Paulo, onde via homens e mulheres tendo relações sexuais, e que passou a ter uma imagem de repugnância à mulher, a odiar as mulheres.
Senador Cristovam Buarque, quando um menino tem acesso a imagens de mulheres nuas tendo relações com outras mulheres e animais, um menino que, em sua índole e intuição primária, vê nas mulheres o reflexo da própria mãe… E é por amor a uma mulher que um homem vence todos os obstáculos, se forma, vence dificuldades mil para poder sustentar os sonhos dessa mulher pela qual se apaixona, sonhos de ser mãe e esposa – e isso move o mundo: a mulher quer ser mãe, e o homem, apaixonado pela mulher quer satisfazer seus sonhos, seus desejos, esse é o combustível primário da alma que move o mundo. Quando esses meninos são expostos a imagens repugnantes, eles começam a ter alucinações e demência. Fiquei com essa imagem clara, quando saí da visita ao maníaco do parque.
Esse louco, que assassinou crianças, tinha acesso ao mesmo tipo de imagens que o maníaco do parque – não época do maníaco não havia computador, não havia Internet – , quando acessava sites pornográficos. Saiu para assassinar crianças, meninas, que, na sua loucura, seriam, no futuro, a impureza, a devassidão e tudo o que ele, na sua loucura, reputava como objeto de ódio.
Sr. Presidente, tenho um projeto nesta Casa. As crianças hoje saem da escola – pouquíssimas têm horário integral – e voltam para as comunidades carentes. Ali, têm acesso às lan houses, que, por três ou quatro reais a hora, possibilitam o acesso dessas crianças aos sites mais decadentes, a uma verdadeira Sodoma e Gomorra planetária, o que traz consequências equivalentes às de uma hecatombe, um dilúvio, algo que nós não podemos dimensionar.
Mais que isso: o Brasil tem uma fábrica de munição desde João VI, e sempre fomos monopolistas nesse setor. Essa fábrica se modernizou e hoje é a Companhia Brasileira de Cartuchos.
Ela produz cartuchos, munição para pistola, revólver, fuzil e metralhadora. Acima desse calibre, nós importamos. Ela é a maior produtora do Brasil. Não só fornece para todas as nossas polícias como para o Exército. Estou desconfiado que ela exporte também, tanto para os países africanos que são grandes consumidores de armas do Brasil, quanto para os países como Peru, Colômbia, Bolívia e Paraguai .
Propus também, Sr. Senador, uma CPI das Fronteiras. Por que a CPI das fronteiras? Porque esta Casa, em 2005, me deu a honra de aprovar uma lei de minha autoria, que dava poder, atribuição de polícia ao Exército, às fronteiras. De lá para cá, o Exército, que deveria guardar nossas fronteiras, não sei se por falta de recursos – quero crer que por falta de recursos – não tomou as medidas necessárias, porque continua grande a oferta de cocaína nas grandes cidades brasileiras e também grande a posse e o porte de armas e munição na mão de traficantes, assassinos e loucos.
Eu não sei por que aquela lei que aprovamos e o Presidente Lula sancionou não surtiu os efeitos desejados. Mas vamos descobrir quando tivermos aqui uma CPI, quando este Senado se debruçar, quando os Senadores forem para a fronteira e conversarem com os empresários, com as autoridades locais, com os políticos locais, quando atravessarem a fronteira e falarem com seus colegas no Peru, na Bolívia, na Colômbia e no Paraguai, quando trouxerem aqui a Polícia Federal, o Ministério Público, o Sindacta, o Exército, a Marinha e a Aeronáutica.
Nós precisamos tomar providências. Os Estados Unidos tomaram providências nas fronteiras com o México. Eu vi, eu fui lá, eu visitei. Ali tem ronda de motocicleta, tem ronda de carro, tem radares de calor, tem aviões, tem helicópteros patrulhando e, não satisfeitos com isso, criaram um muro. Fizeram um muro de milhares de quilômetros.
Os países reafirmam sua soberania. O Brasil não pode se dizer um país soberano enquanto tiver nossas fronteiras completamente abertas. Aquilo é um deserto aberto, e nós temos disparidades imensas com o nosso crescimento econômico e o dos nossos vizinhos.
O Sr. Blairo Maggi (Bloco/PR – MT) – Senador Crivella, por favor, um aparte.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – com o maior prazer, concedo o aparte ao Senador Blairo.
O Sr. Blairo Maggi (Bloco/PR – MT) – Senador Crivella, quero cumprimentar V. Exª pelo pronunciamento e aqui externar a minha solidariedade a V. Exª, que é um dos representantes do Rio de Janeiro, pela tragédia que ocorreu na escola estadual. Mas quero aqui me somar ao seu esforço na questão da CPI. Acho que não é mais possível, não podemos mais adiar a entrada do Senado Federal para verificar o que acontece nas nossas fronteira e por que acontece nas nossas fronteiras. V. Exª já tem as assinaturas suficientes para a instalação de uma CPI. Temos que pedir ao Presidente Sarney que instale essa CPI, para que possamos nos debruçar sobre esse assunto e trazer para a sociedade brasileira o raio X do que acontece nas fronteiras. O meu Estado tem mais de mil quilômetros de fronteira seca com a Bolívia e, se não for a presença do Estado de Mato Grosso, com seus parcos recursos financeiros e de pessoal, fazer a guarda daquela fronteira, não teríamos nada. Mas o muito que nós podemos colocar é pouco perto daquilo que é necessário. Muitas e muitas vezes, já foi reclamado ao Governo que tomasse providências. Se nós não fecharmos as fronteiras – e aí vai lá por Rondônia, pelo Amazonas, pelo Mato Grosso do Sul, descendo para o Paraná, sai no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, e aí tem todo o nosso litoral para cuidar também –, se nós não cuidarmos da fronteira, o Rio de Janeiro, São Paulo, todas as cidades brasileiras… Essa questão da droga, Senador Crivella, não é uma coisa do Rio de Janeiro. Se o fosse, era fácil resolver. O senhor vai ao Mato Grosso, à cidade de Sapezal, onde eu planto soja, onde meu pai fundou a cidade, e há problema de drogas. Você vai à sede de uma fazenda e há problema de drogas. A droga se generalizou por todos os lugares. Enquanto não tomarmos providências, nós não teremos paz, não teremos sossego. Quero aqui me somar ao seu esforço, quero me colocar à disposição para trabalhar, primeiro, para implantar a CPI e, depois, pular dentro da CPI e lá fazer o que tem que ser feito. Não significa crucificar o Governo, mas dizer o que tem de errado, o que nós temos que fazer para melhorar. A sociedade terá que escolher. Eu acho, sinceramente, Senador, que é muito mais barato cuidar da fronteira que fazer a guerra nos morros do Rio de Janeiro, com pessoas inocentes que não têm nada a ver com isso pagando parte dessa conta. Quero aqui cumprimentar V. Exª. Até telefonei para V. Exª hoje de manhã e, depois, conversei aqui, porque li no jornal do nosso Senado – eu não estava aqui ontem quando V. Exª falou sobre isso –, para dizer que estou de pleno acordo com a implantação da CPI. Espero que ela seja implantada e espero poder estar junto para ajudar a resolver este assunto, pelo menos indicar um caminho. Parabéns!
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – Muito obrigado, Governador. A palavra de V. Exª é lúcida. Nós não podemos combater as drogas no varejo. Nós temos que combatê-las no atacado. Depois que elas se dividem por milhares de papelotes e são oferecidas até na porta das escolas, no momento em que o ser humano tem a sua curiosidade aguçada, meninos caem nessa armadilha e, depois, não conseguem se libertar. V. Exª me dá um apoio extraordinário, porque, no dia em que o Presidente ia ler, o Ministro da Justiça, o nobre e ex-Deputado Eduardo Cardozo, ligou para mim e disse: “Crivella, espera um mês”. Eu disse: “Está bom, vou esperar. Agora, espero que o senhor depois não me ligue pedindo mais um mês”. Então, chegou a hora – V. Exª sabe; nós não podemos mais esperar – de nos debruçarmos, irmos para lá, olharmos, conversarmos com todos, inclusive com os Parlamentares do outro lado da fronteira, trazermos um raio X, fazermos um relatório, mostrarmos ao Governo, de tomarmos as providências que temos que tomar.
Eu ouço, com muito prazer, o Senador Ivo Cassol.
O Sr. Ivo Cassol (Bloco/PP – RO) – Obrigado. É com alegria que quero aqui agradecer ao nobre colega, nosso Senador Marcelo Crivella. Quero aqui, primeiramente, solidarizar-me com todo o povo carioca por esta tragédia que aconteceu nesta semana, que não só abalou as famílias cariocas, mas, com certeza, mexeu com o sentimento de todo o povo brasileiro. Episódio jamais visto na história brasileira. Vimos isso em filmes, em outros países, como aconteceu nos Estados Unidos, país de Primeiro Mundo. Infelizmente, acabou atingindo o nosso País também. Mas, além disso, também quero aproveitar essa oportunidade por ser de um Estado que tem 1.470 quilômetros de faixa de fronteira e, ao mesmo tempo, por ser parceiro de V. Exª nessa CPI das Fronteiras. Eu assisti e vejo. Fui Governador por dois mandatos e sei a dificuldade por que passei. Agora há pouquinho, no aparte, eu ouvi o Senador, meu colega, ex-Governador também, Blairo Maggi, falar do Mato Grosso. E lá também tem milhares de quilômetros de divisa com outros países, igual ao caso da Bolívia. Eu vi, há pouco tempo, Senador Marcelo Crivella, o Governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, juntamente com o Governo Federal, fazer um trabalho extraordinário nos morros do Rio de Janeiro, trabalho que envolveu a sociedade e que levou para aqueles morros a presença da polícia e do Governo. Aí, quero aqui deixar uma pergunta para a sociedade carioca, para o povo lá do Rio que viveu momentos piores que os de guerra. Os traficantes correram, todo mundo assistiu àquelas imagens na televisão, mas, agora, é como se não existisse mais traficante no Rio de Janeiro. Eu quero dizer para o senhor que o mal se elimina pela raiz. O mal se acaba pela raiz. O trabalho que foi feito no Rio de Janeiro é um trabalho que simplesmente levou os traficantes – do Rio de Janeiro, de São Paulo, dessas favelas – a se especializarem. A exemplo disso, antes os traficantes comandavam essas favelas; hoje, eles elitizaram essas favelas. Hoje, eles não querem mais comandar as favelas, mas estão vendendo drogas nas favelas, sem precisar mandar, como se fossem um governo paralelo ao Governo constituído pela nossa Constituição. De que maneira podemos acabar com isso e ajudar o Rio de Janeiro, para que a Copa do Mundo seja um modelo em nível mundial? Para que os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, da sua cidade, do seu Estado, sejam um modelo mundial? Só há uma maneira: combater nas fronteiras. Eu deixo aqui meu abraço para o nosso Comandante Maior das Forças Armadas, General Enzo, que nos recebeu nesta semana, na última quarta-feira, em seu gabinete. Ali eu dizia para ele sobre a propositura deste Parlamentar. Eu dizia para o General que precisávamos, urgentemente, das Forças Armadas – Aeronáutica e Exército – presentes nas faixas de fronteira. Ao que nós assistimos hoje, nobre colega Senador Marcelo Crivella, Senador Pedro Taques, Senador Blairo Maggi, demais Senadores e Sr. Presidente? O que a gente vê hoje? Muitas vezes, a gente assiste ao nosso Exército brasileiro se estruturando dentro das capitais. Até você sair da capital e ir à faixa de fronteira, acabou o combustível da aeronave! Até você sair e se deslocar com esses aviões – os caças que há em Porto Velho – e chegar em Guajará-Mirim, já acabou o combustível! Então, nós, Guajará-Mirim, precisamos fortalecer o nosso Exército que está lá. O Forte Príncipe da Beira, que tem uma base, precisa ser fortalecido com pista asfaltada para os aviões fazerem a nossa guarda nacional lá na divisa. É preciso também fazer uma estrutura lá em Pimenteiras e outra em Porto Rolim de Moura, como também no Mato Grosso, como também no Acre, como também no Estado do Mozarildo, do nosso Presidente, em Roraima, enfim, em todos esses pontos principais, para podermos cuidar das nossas faixas de fronteira. Aí, ouvi há poucos dias alguém dizer o seguinte: “Ex-Governador e Senador, o Exército brasileiro não está preparado para isso, para ficar na divisa”. Eu disse: “Espere aí: se ele está preparado para uma guerra, não vai estar preparado para botar bandido e traficante e contrabandista de armas para correr?” Isso é conversa para boi dormir. Não concordo com V. Exª. Nós temos condições, sim. O nosso Exército brasileiro precisa de mais dinheiro, precisa de condições. Volta e meia, estão cortando o orçamento do Exército brasileiro. Eu pactuo aqui para não cortarem. Em vez de cortar, esse dinheiro tem que estar lá em novas bases na faixa de fronteira. Saíram armas que foram armar os traficantes no Rio de Janeiro? Saíram da nossa cidade, passaram por Ji-Paraná, aí, mais uma vez, fica o Estado de Rondônia manchado. Da mesma maneira, nós fizemos a Operação Muralha no nosso Estado. Começou por mim, e depois o Governador João Cahulla deu continuidade. Quantos quilos de cocaína nós apreendemos? Numa pegada, foram 250 kg; na outra, mais 100 kg, mas quase não mostraram na mídia nacional, porque quem fez foi o Estado. Se fosse a Polícia Federal, talvez a imprensa nacional estaria toda presente. Porque foi o governo do Estado que fez, então não dão cobertura, não querem manchete. É o contrário. Quero pedir aqui para as televisões brasileiras que deem cobertura aos governantes, independentemente de partido, para combatermos essa droga. E aí só temos um caminho, e o caminho o senhor está nos trazendo: é uma CPI com participação dos Senadores das faixas de fronteira, para darmos condições ao Exército brasileiro. São 1.470 km de faixa de fronteira em Rondônia, Senador, e quem estava cuidando lá era o Estado, com as suas dificuldades. A maioria dos presos nas cadeias de Rondônia é preso federal, por causa de drogas. E está lá o Estado sustentando, pagando, não tem espaço, com toda dificuldade que tem. Pactuo com o senhor: precisamos urgentemente dar condições, dar legalidade para que o Exército brasileiro faça toda a guarda nacional nas faixas de fronteira, para que se evite na raiz, para que a droga não entre. A droga acaba com a nossa família, a droga acaba com nossos filhos, a droga acaba com a sociedade, e sem contar o contrabando de armas. E é tão fácil passar naquele rio Guaporé, mas é tão ruim para nós, brasileiros. Portanto, parabéns pelo trabalho que vocês fizeram no Rio de Janeiro, ao Governador Sérgio Cabral, ao prefeito, pelo combate nos morros, mas quero dizer ao governador do Rio: só isso não basta. É preciso que nos ajudem a combater na raiz, e a raiz é lá na faixa de fronteira. Muito obrigado pela concessão do aparte, e sucesso.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – Muito obrigado, Senador, Governador.
O Governador Cabral me pediu para fazer essa CPI. Ele sabe que a operação no Rio de Janeiro é mais espanador. O que faz o espanador? Espana o pó, espalha o pó. Mas temos mil comunidades carentes, e a boca de fumo vai para as outras comunidades, e a cocaína é vendida, o papelote, a R$4,00. Como é que um produto importado das serras da Colômbia, da Bolívia e do Peru, que produz 95% da cocaína do mundo, chega a R$4,00? É muito barato. Mas por que é barato? É barato porque é fácil trazer. É barato porque vêm em trens, nos lombos de mula, vêm em carros, atravessam nossas fronteiras e chegam às grandes capitais e em todas as cidades para destruir nossas famílias.
Ouço, com prazer, o nobre Senador Pedro Taques.
O Sr. Pedro Taques (Bloco/PDT – MT) – Senador Crivella, em nome da honestidade da fila, o Senador Cristovam pediu antes de mim.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – Pois não, com o maior prazer.
Senador Cristovam Buarque.
O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT – DF) – Terei o maior prazer em ceder.
O Sr. Pedro Taques (Bloco/PDT – MT) – Muito obrigado, Senador. Quero apartear V. Exª, e obrigado por conceder-me o aparte. Sr. Presidente, Srs. Senadores, vou dividir o meu aparte em três partes, muito rápido, porque o discurso é de V. Exª. A primeira parte, quero emprestar a V. Exª, como Senador do Estado do Rio de Janeiro, representante daquele Estado, a solidariedade por esse acontecimento terrível da data de ontem, que não pode ser reduzido a algumas causas. Há muitas causas, que precisam ser debatidas por esta Casa sem palpites, sem achismos. Devemos debater as causas com a tranquilidade que é devida. E quero emprestar também a solidariedade aos familiares dessas crianças, adolescentes que foram vitimadas no Rio de Janeiro. Coloco-me à disposição para me somar a V. Exª no debate dessas causas, para que possamos não mais ter consequências dessas causas. Essa é a primeira parte.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – Obrigado.
O Sr. Pedro Taques (Bloco/PDT – MT) – O que me preocupa, nesse acontecimento do Rio, é o chamado fenômeno da repetição. Temos que nos preocupar muito com isso. Em fenômenos como esse, fenômenos criminosos como esse que ocorrem no mundo todo, a primeira preocupação que devemos ter é com a repetição. Então, devemos pensar para a frente. Esse é o primeiro ponto do meu aparte. O segundo é somar a V. Exª para a necessidade dessa CPI. O que ocorre no Rio de Janeiro não é privilégio do Rio de Janeiro. Apesar de sua beleza, o que ocorre no Rio de Janeiro ocorre também nas grandes cidades brasileiras. É a falta da presença do Estado — União, Estados membros e Municípios —, porque os crimes, Sr. Senador Crivella, ocorrem por várias causas, mas temos o vezo de entender que só existe uma causa para todos os crimes. Alguns crimes ocorrem por causas sociais, é a falta de uma educação de qualidade, é a falta de dignidade para o cidadão. Esses crimes ocorrem por essas causas. Agora, há outros crimes, outros crimes como esse que aconteceu ontem no Rio de Janeiro, cujas causas são diferenciadas. Como temos causas diferentes, os remédios devem ser diferentes também. Essa CPI da Fronteira pode nos revelar as verdadeiras causas do que ocorre no Rio de Janeiro. A questão do tráfico de substância entorpecente nós precisamos tratar com repressão. Perceba que eu não tenho medo das palavras. As palavras são símbolos, são signos, devem ser pronunciadas de acordo com seu momento histórico. Repressão, até a década de 80, tinha um conteúdo político-ideológico. Hoje, repressão não tem mais esse conteúdo político-ideológico, porque a Constituição, no art. 144, fala que cabe à Polícia Federal fazer a repressão e a prevenção do tráfico de drogas. Repressão ao tráfico de drogas sem violação a direitos fundamentais do cidadão. É disso que nós precisamos. Agora, aquele que é consumidor de substância entorpecente nós precisamos tratar devidamente, porque é um mal, quem sabe até psicossocial. Esta é a segunda parte do meu aparte. Quero me somar a V. Exª, porque faço parte de um Estado que tem uma extensão muito grande de fronteira seca com a Bolívia, por onde também entra a substância entorpecente, ficando muita quantidade no nosso Estado, o Estado de Mato Grosso, o que traz a prática de outros crimes que estão ao derredor do tráfico de substância entorpecente e também do contrabando de armamentos, porque o Rio de Janeiro não fabrica as armas que lá são utilizadas. Por fim, quero também dizer que as Forças Armadas, não só o Exército, têm uma função importante na Constituição, uma função histórica, desde a proclamação da República, e até antes, por ocasião da Independência. As Forças Armadas têm funções diferentes da Polícia. A Polícia Militar e a Polícia Civil têm a função de prender para que Justiça julgue, para que o cidadão possa ser ressocializado, para que ele volte à sociedade. As Forças Armadas têm função diversa. As Forças Armadas são treinadas para eliminar o inimigo, abatê-lo. Essa é a função das Forças Armadas. Mas nós temos que fazer com que as Forças Armadas tenham uma nova participação na atual realidade em que nós vivemos. Temos que dar às Forças Armadas – e a Constituição já fez isso desde 1988 – uma outra função. Se formos tratar de geopolítica, as Forças Armadas hoje não tem essa função de uma guerra externa e nós também não temos mais o que a Escola Superior de Guerra denomina de guerra ideológica interna. Nós temos que buscar nas Forças Armadas uma nova função, como ocorre na participação das Forças Armadas no Haiti, por exemplo. Se nós formos acompanhar os postos, as guarnições militares das Forças Armadas no território nacional, no Rio Grande do Sul, na fronteira com a Argentina e o Uruguai, nós temos muitas guarnições das Forças Armadas. Por que isso? Porque, naquele momento histórico, nós temos uma pendência na geopolítica com a Argentina e com o Uruguai. Essa pendência já restou superada, a pendência com o Paraguai já restou superada, daí Itaipu, as causas para que as guarnições lá fossem instaladas já foram superadas. Agora, a região Norte do Brasil e a região Centro-Oeste do Brasil precisam de uma nova visão das Forças Armadas. Eu quero me somar a V. Exª e dizer que concordo com a CPI das Fronteiras e em rediscutir o papel das Forças Armadas. Muito obrigado e parabéns por sua fala.
O SR. MARCELO CRIVELLA (PRB – RJ) – Eu que agradeço o aparte de V. Exª, que tem toda razão. Eu fui oficial do Exército e nossa hipótese de guerra era contra a Argentina, contra o Uruguai, contra o Paraguai ou contra os três. Esse era o estudo dos capitães na Esao e dos majores e coronéis na Eceme. Não existe mais essa hipótese de guerra, ela resta superada. Agora, temos um inimigo, que é o narcotráfico.
Este Senado me deu a honra de aprovar uma lei minha que dava papel de polícia federal, nas fronteiras, ao Exército. O Presidente sancionou em 2005 e estamos em 2011. Por que ainda temos quartel em Copacabana, Grupo de Artilharia, muitos militares no Forte Copacabana, no Leme, o Forte Imbuí, a Vila Militar imensa? Por que a nossa Brigada de Paraquedistas? Eu fui paraquedista, é a nossa tropa mais operacional. Por que o nosso quartel de Comandos? Os Comandos são aqueles militares treinados para pilotar helicóptero, são submarinistas, são paraquedistas, têm curso de guerra na selva, são capazes de fazer operação a qualquer momento e em qualquer ponto, são os militares mais treinados. Nossas Forças Especiais, acima do Comando, têm treinamento, inclusive no estrangeiro, guarnições no Rio de Janeiro, na avenida Brasil…
Mas, por que, eu pergunto, se o Congresso Nacional, detentor das esperanças do povo brasileiro, entregou às Forças Armadas o papel de polícia federal nas fronteiras, e isso já faz anos, por que ainda temos tanta cocaína oferecida a R$5,00, R$3,00, papelotes que, num momento de desilusão, num momento de infelicidade, de amargura, um desempregado ou seu filho acaba cheirando aquilo e se tornando um viciado?
Essas coisas deviam ser raras, deviam ser caríssimas. Infelizmente, elas estão banalizadas, e o Rio de Janeiro e as grandes cidades do Brasil barbarizados. Precisamos tomar uma providência! “Mas, Crivella, o que está acontecendo?” Eu não sei, mas vou descobrir. Eu, o Mozarildo e os meus colegas vamos descobrir. Quando? Quando tivermos uma CPI.
O Brasil, repito, tem uma fábrica de munição, sempre tivemos, monopolista desde D. João VI. Era aquela fábrica que ficava no Jardim Botânico. Foi D. João quem fundou. Hoje, ela se chama Companhia Brasileira de Cartuchos. Fabrica revólver, pistola, fuzil, metralhadora. Não fazemos projetil de canhão, de morteiro, que nós importamos, mas os armamentos leves fazemos todos. Fazemos também explosivos, dinamite, etc., para fazer túneis. O trem-bala terá dez bilhões de túneis. Quem vai explodir essas rochas todas? Nossas dinamites. Eu pergunto a V. Exª: será que essa fábrica, que vende muito para a África… O nosso maior comércio com a África, desgraçadamente, um dos maiores comércios, é de armas. Os africanos compram muitas armas e munição, mas vendemos também para a América do Sul… Eu pergunto a V. Exª: munição em profusão, caminhões, cargas, lotes imensos para o Paraguai, será que isso não volta ? Porque, no Rio de Janeiro, nas comunidades há paióis enormes, não falta munição. Agora, só vamos saber isso com a CPI.
Eu gostaria de ouvir o Senador Cristovam Buarque, do bravo Estado do Distrito Federal.
O Sr. Cristovam Buarque (PDT – DF) – Senador Crivella, vou falar daqui a pouco, logo depois do senhor, e vou continuar, retomar o assunto de ontem, questionando o porquê de uma tragédia como aquela, porque numa escola e o que fazer. E o que fazer, Senadores, está espalhado neste Senado em projetos de lei parados, como eu próprio tenho alguns. Um deles é a criação de uma agência de segurança dedicada à escola, dentro e ao seu arredor. A gente tem que criar uma agencia que se preocupe com isso. Não é a PM que é capaz de fazer isso. A PM é capaz de cooperar. E tem que ser dentro do Ministério da Educação, não tem que ser dentro de um ministério repressor. Mas quero falar sobre um assunto que o senhor abordou, que acho muito importante sob o ponto de vista educacional, que é a erotização precoce das crianças brasileiras. Não vou dizer que isso provoque esses crimes, embora em alguns casos eles possam ser fruto de mal-educação nesse sentido. Mas independentemente disso, desvia a criatividade, desvia a sensibilidade da criança para algo que ainda não está no nível da curiosidade dela. A gente tem que adaptar o que se mostra. O que se faz, o que se ensina a uma criança do ponto de vista de sexo, de erotismo, tem que ser adaptado ao nível da criança. Hoje não é assim. Hoje, pela televisão, a criança é surpreendida antes da idade vendo coisas que ainda não tinha curiosidade. Isso cria, cada vez mais, uma deformação nas nossas crianças, que chega à nossa juventude. Ou cuidamos de evitar esse processo da erotização precoce das crianças ou vamos ter consequências muito negativas, na pornografia, no pedofilismo, até mesmo, por frustração de alguns, transformando pessoas que poderiam ser calmas em violentas. Então, é importante esse assunto que o senhor trouxe, independentemente mesmo do que aconteceu no Realengo. Mas é uma preocupação que devemos ter, os preocupados com a educação, no que se refere a essa característica hoje muito forte no Brasil. É muito mais forte no Brasil do que em outros países. Você comparar uma criança norte-americana e uma brasileira da mesma idade, você verá como a nossa tem muito mais precocidade em relação ao erotismo e ao sexo em geral. Portanto, foi bom o senhor trazer esse assunto, e eu espero que a gente continue defendendo uma forma de evitar isso. E não venham me dizer que isso tira a liberdade. Isso dá ética. E vamos ver como é que faz, sem afetar os fundamentos básicos da liberdade, sobretudo os da imprensa.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – Senador, agradeço muito a V. Exª.
Sem dúvida não podemos generalizar, mas fiquei marcado com o depoimento que ouvi do maníaco do parque, que me disse haver desenvolvido uma imagem pejorativa e de ódio às mulheres, observando as cenas que via, escondido, no parque. E esse louco, assassino, no Rio de janeiro, passava horas e horas na Internet, que é hoje, alguns a chamam de infernet, uma Sodoma e Gomorra de proporções planetárias. É impressionante a que ponto chega a decadência humana em imagens que afrontam, que agridem e que, na mão de um adolescente desocupado, lhe tomam a mente e, às vezes, são gatilhos ou pavios para detonar todo tipo de devassidão de uma natureza já com inclinações psicóticas.
Eu acho que nossas escolas deveriam se transformar em verdadeiros santuários de nossa Pátria. Nossos meninos e meninas protegidos, muito mais do que qualquer riqueza natural, muito mais do que a nossa petrosal.
Senador Cristovam Buarque, V. Exª que tem sido para nós um ícone, uma referência, um gladiador, um bandeirante, com uma fibra enorme nesse discurso, a fé de um mártir em defesa da educação no Brasil como o maior dos direitos, V. Exª tem razão, nós precisamos ter segurança nas escolas. Isso é o mínimo que a nossa civilidade nos impõe.
Eu, outro dia, peguei as minhas recordações – eu já vou terminar, mas deixe-me extravasar isso –, que eu guardo numa mala, as coisas que me são caras. Tinha lá as cartas que recebi da minha namorada, minha esposa, a conheci quando tinha 15 anos. Até nos casarmos, as cartas todas da minha esposa se relacionavam ao casamento, ao lar, à família, a lutarmos juntos, a construirmos a vida. São dezenas de cartas de uma beleza enorme. Depois que nos casamos, tem o diário dela, aí já começa a preocupação: “eu quero ter uma filha”, “meu Deus me ajude”, “fui ao médico”, “não estou grávida”. Até que as cartas, as páginas do diários começam a dizer: “hoje tive a maior notícia da minha vida: estou esperando neném”, “pela primeira – mais na frente – senti a mãozinha, senti o pezinho, senti um chute”, “fiz a ultrassonografia; vai ser uma menina”, “estou pensando em escolher o nome”, “fui ao médico”, “não está hora ainda”, “voltei”, “tive minha filha! É a cosia mais linda do mundo!”. Enfim, a vida de uma mulher. Eu fico imaginando como se fosse aqueles cachoeiras do Iguaçu, a natureza, a vocação, a índole que vinca a alma feminina é o sonho de ter um lar e ser mãe. Elas não nos associam, nos deslumbram com seus sonhos e sua beleza, e nós movemos o mundo, nos formamos, conseguimos emprego, fazemos empresas, pesquisamos e somos partidários e financiadores desse sonho por uma coisa genética, biológica, espiritual. E assim move-se o mundo.
Eu fico pensando o que acontece com as minhas irmãs de Realengo, essas senhoras que agora vão ficar na porta da escola, esperando aquela filhinha que elas tanto sonharam em ter, e que durante um certo tempo não sabiam quem era mãe e quem era ela, onde começava e onde terminava uma e outra, e essa mãe já não terá mais essa menina nos seus braços.
Olha, este ano, o Rio não vai ter primavera. Em 2011, no Rio de Janeiro, nós vamos ter inverno, outono, verão, mas primavera não vamos ter, porque perdemos nossas crianças.
Que Deus guarde essas meninas e esses meninos que nós, desgraçadamente, não soubemos guardar!
Muito obrigado, Mozarildo.