O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srs. Senadores, senhores telespectadores da TV Senado, senhores ouvintes da Rádio Senado, senhores presentes ao nosso plenário, passei o Carnaval na África, na Zâmbia, e é impressionante como os países da África austral estão sofrendo. Expectativa de vida, hoje, de uma criança que nasce na Zâmbia, no Malawi, em Botswana, no Zimbabwe, na África do Sul, no Lesoto, na Suazilândia, na Namíbia ou em Moçambique é de 40 anos. Quarenta anos de idade!
A Aids está sendo uma devastação e, por incrível que pareça, Sr. Presidente, até hoje não existe um laboratório que produza, na escala da necessidade do povo africano, os medicamentos retrovirais que poderiam dar pelo menos de dez a quinze anos a mais de vida às pessoas que morrem aos milhares. Na Zâmbia, oitenta mil pessoas morrem de Aids por ano. São pessoas na fase produtiva que deixam órfãos meninos e meninas que acabam sendo criados pelos avôs e avós, numa situação muito difícil.
O Presidente da Zâmbia me recebeu em audiência. Tive a honra de estar com o Presidente Rupiah Banda – amigo do Brasil, adora futebol –, pedindo ajuda para que os termos de cooperação, que precisam ser ratificados pelo Congresso, entrem em ação e que o Governo brasileiro possa mandar para lá técnicos de pecuária da Embrapa – o rebanho foi devastado pela tuberculose – para que também os ensinem a produzir cana-de-açúcar para produção de etanol. Estão esperando também técnicos que possam ajudá-los a aumentar a produção de alimentos, sobretudo de milho e de girassol, do que eles têm uma grande produção, Sr. Presidente, de onde retiram óleo.
Portanto, nós do Congresso precisamos ratificar esses acordos o mais rapidamente possível. Estive falando com o Deputado Arnaldo Faria de Sá, que se sensibilizou com o quadro da Zâmbia que passei e irá, ainda nesta semana, levar à pauta da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados o Acordo de Cooperação Brasil-Zâmbia, para que possamos, imediatamente, implementar a ida desses técnicos, bem com do laboratório de Manguinhos, no Rio de Janeiro, da Fundação Oswaldo Cruz, em colaboração com o laboratório Farco, uma organização zambiana e alemã, passar para eles conhecimentos para a produção de remédios de combate à Aids. É trágico, é triste ver como aquele povo tão extraordinário, de uma cultura tão bonita, um povo de tamanha resistência às agruras da vida, hoje está sendo vitimado por essa calamidade.
Sr. Presidente, também trago notícias importantes sobre o meu Estado, sobre a minha terra, que dizem respeito ao aeroporto, aeroporto em que V. Exª, que gosta tanto do Rio de Janeiro, tantas vezes já pousou.
Recebi, há alguns dias, um artigo de autoria do Sr. Antônio Oliveira Santos, Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo. Nesse artigo, que é um lindo libelo em defesa do Santos Dumont, ele faz considerações importantes a respeito dos investimentos feitos pelo Governo do Presidente Lula na Infraero, que remodelou todo o aeroporto Santos Dumont, que hoje está uma beleza, mas que, infelizmente, continua sendo muito pouco utilizado.
O aeroporto Santos Dumont é um ícone da arquitetura modernista brasileira. Seu terminal de passageiros foi tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Artístico e Cultural em agosto de 1998. E ele tem, vamos dizer assim, como moldura, o Pão de Açúcar, a Baía da Guanabara, a ponte Rio-Niterói, o Parque do Flamengo, obra do extraordinário Governador Carlos Lacerda, a Ilha Fiscal, o Museu de Arte Moderna.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – Sr. Presidente, peço a V. Exª que tenha paciência.
O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB – PI) – Não se preocupe, V. Exª terá o tempo que achar conveniente.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – Muito obrigado. Agradeço a V. Exª.
Então, ele diz também, Sr. Presidente, que o Santos Dumont, passou, recentemente, por esse processo de reforma e ampliação, que aumentou sua capacidade de 3,2 milhões de passageiros por ano para 8 milhões de passageiros.
Ao prédio antes existente, que ficou apenas para desembarque, foram agregados mais dois, um para desembarque e outro para interligação. O acesso às 8 pontes de embarque é feito por um conector de 300 metros de extensão: um tubo metálico com as laterais e a cobertura envidraçadas, que permitem uma ampla visão da Baía da Guanabara.
Realmente, o aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, é um aeroporto muito moderno.
Apesar de tudo isso, no entanto – chego, aqui, às razões que levaram o Sr. Antônio Oliveira Santos a publicar seu artigo –, o aeroporto Santos Dumont vem sendo subutilizado. Nele, hoje, só há a ponte aérea Rio-São Paulo.
Durante as obras de reforma e ampliação, que foram executadas entre 2005 e 2008, os vôos com destino a Brasília, Belo Horizonte e Vitória, entre outros, foram transferidos para o Aeroporto Internacional Tom Jobim, o aeroporto do Galeão. Agora, ao terminarem as obras, esses vôos não retornaram ao Santos Dumont.
Pois bem. A obra do aeroporto Santos Dumont está pronta, o aeroporto está uma beleza, mas esses voos para Belo Horizonte, Brasília e Vitória continuaram no aeroporto do Galeão. Todos sabemos que, para a grande maioria dos usuários que vêm de outras cidades, o foco de interesse no Rio de Janeiro são os escritórios localizados no centro ou nas suas proximidades e, para os turistas, a praia de Copacabana, a praia de Ipanema, os bairros da orla.
Portanto, Sr. Presidente, sem dúvida alguma, a utilização mais intensa do Santos Dumont só traz vantagens, seja do ponto de vista econômico, pela significativa diminuição dos custos de deslocamento, seja no que diz respeito ao conforto dos usuários.
Os especialistas em transporte costumam repetir uma máxima: “estações rodoviárias, ferroviárias e aeroportos, desde que não atrapalhem a cidade, devem ficar o mais perto possível do centro”.
Quanto a essa questão, o projeto de reforma e ampliação do Santos Dumont foi suficientemente cauteloso. Tomaram-se os devidos cuidados para que o aeroporto não atrapalhasse o centro. Executou-se um criterioso estudo de tráfego, para garantir que o aumento do número de passageiros não impactasse negativamente a circulação viária da região.
Há que se dizer ainda, Sr. Presidente, que esse preceito de não se afastar os usuários de seus pontos de interesse é obedecido nas grandes cidades da Europa, da Ásia e dos Estados Unidos.
Por fim, Sr. Presidente, eu gostaria de deixar claro que esse processo de revitalização do aeroporto Santos Dumont não deve significar um esvaziamento do Galeão.
O Rio de Janeiro, pela localização privilegiada e pelo que representa em termos econômicos e, principalmente, culturais, tem tudo para continuar sendo a principal porta de entrada no País de uma vasta parcela dos turistas e homens de negócios que vêm do exterior. Por isso, na medida em que os vos domésticos voltam ao Santos Dumont, deve-se também, paralelamente, fazer retornar ao Galeão os voos que, nas últimas décadas, foram, pouco a pouco, sendo transferidos para Guarulhos, numa competição predatória entre dois aeroportos que, na verdade, têm funções distintas.
Agora mesmo, o Governo de Angola me pediu que fizesse um apelo ao Presidente da Infraero para que, além do voo Luanda-Rio de Janeiro – são cinco por semana – houvesse um também para São Paulo. Aí, o Presidente da Infraero disse: “Olha, mas São Paulo não tem mais slots para atender”. É impressionante! É impressionante que São Paulo não tenha mais slots para atender a voos internacionais e o Rio de Janeiro esteja subutilizado. Era preciso equilibrar isso. É preciso equilibrar isso. Sei que a Infraero está tentando revitalizar o aeroporto de Cumbica, em Campinas, um belíssimo aeroporto, mas não pode ser em prejuízo do aeroporto do Galeão, onde os investimentos do Governo foram enormes, e não apenas deste Governo, mas de todos os que o antecederam.
Então, o Rio de Janeiro precisa muito do turismo. São Paulo tem as indústrias, São Paulo é a máquina, é a locomotiva econômica do País, e o Rio de Janeiro tem o turismo, área de serviço, sobretudo a área cultural, como sua grande, vamos dizer assim, indústria econômica.
Então, é preciso que o Governo e as autoridades do Ministério da Defesa levem em consideração isto que estou dizendo aqui, Sr. Presidente. Não se pode aceitar que, enquanto outros aeroportos do Brasil trabalhem acima de seus limites, tenhamos, no Rio de Janeiro, dois aeroportos com capacidade ociosa.
Então, Srªs e Srs. Senadores, são as posições defendidas pelo Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo em seu artigo, posições com as quais, volto a dizer, estou plenamente de acordo.
Peço também, em outro requerimento do meu gabinete, que, considerando os profundos laços de amizade existentes entre o Brasil e a Guiné-Bissau, nos termos do art. 222 do RISF, nosso Regimento Interno, seja apresentado voto de pesar, ao povo e ao Presidente da Assembleia Nacional da Guiné-Bissau, pelo falecimento do Presidente João Bernardo “Nino” Vieira, vitimado por ataque desferido contra a sua residência nesta segunda-feira, dia 2 de março de 2009.
O povo da Guiné-Bissau está em luto porque seu Presidente foi brutalmente assassinado por um setor do Exército que lhe faz oposição.
Sr. Presidente, a África, o continente africano, na década de 60, tinha espaço para todas as utopias. Achava-se que, com o fim do colonialismo, a África iria encontrar o seu destino, e até se sonhava com a União Africana, a união de todo o continente, derrubando barreiras, derrubando moedas, mantendo-se o grande continente, como é hoje a União Européia, numa grande união, a União Africana. Afinal de contas, são povos com uma mesma origem, com uma mesma raiz.
Ocorre, Senador Jayme Campos, que, contrariando as nossas expectativas, o que se viu foi uma “balcanização”. Como houve nos países da região dos Balcãs, a África recebeu de volta, nesse período em que ela se via livre do colonialismo, seus jovens líderes que, durante a colonização, estudaram na Europa, estudaram na Rússia, estudaram na Alemanha e trouxeram para a África talvez um dos regimes políticos mais cruéis, um dos regimes mais duros já inventado pelo ser humano, que é esse regime de, em cada Estado, haver uma estrutura de Estado para cada região. O presidencialismo, quer dizer, essa coisa de uma África divida por brancos, em setores geográficos que não correspondiam à ocupação de suas tribos, à ocupação milenar de suas tribos, e eles vêm, então, Sr. Presidente, com a idéia de formar ali um Estado, de ter uma burocracia, de ter ministérios. E nós começamos a assistir à criação de Estados, onde não se sabia bem quem seria o governo, a que tribo caberia ao governo, quem seria encarregado das coisas. E a África começa a mergulhar num profundo clima de revoluções civis que até hoje levam ao atraso sua população, mesmo a África tendo recursos naturais extraordinários.
O que nós vemos hoje na Guiné-Bissau ainda é isso, ainda são resquícios desses regimes trazidos, dessas idéias trazidas da Europa pelos jovens líderes africanos, que mergulharam o continente em guerras tremendas.
Angola viveu 35 anos de guerra; Moçambique, a mesma coisa; as revoluções na República no antigo Zaire, a República Democrática do Congo. Agora no Sudão verificamos com tristeza uma guerra étnica que levou milhões de pessoas à morte. Não é diferente no Zimbábue: Robert Mugabe se estende no poder, com conflitos tribais imensos.
Só não assistimos a isso na África do Sul, porque ali, nas palavras de Desmond Tutu, existe um colosso moral que o mundo inteiro inveja, que é o Presidente Nelson Mandela, que conseguiu, com abnegação, com idealismo, com renúncia, nos 27 anos que passou na prisão, se constituir no grande líder africano. Um homem que não aprendeu o ódio, porque, mesmo vivendo 27 anos preso pelo regime do apartheid, ao sair, ele fez um governo para todos, um governo democrático, de maioria, mas sem excluir os brancos. Por isso, hoje, a África do Sul se encontra num nível de desenvolvimento muito mais elevado em relação aos seus vizinhos e vai, inclusive, sediar a Copa de 2010. Grandes obras de infraestrutura estão sendo feitas hoje naquele país. É um país de US$400 bilhões de PIB, um país que tem uma renda per capita superior à do Brasil. A renda per capita da África do Sul se iguala à do Chile, é superior à renda per capita do Brasil. Ainda há a questão da África, ainda existem grandes desigualdades, mas o Presidente Nelson Mandela, talvez o maior líder negro que a África teve no século passado e neste século – ele continua vivo, tem 91 anos –, é um homem extraordinário, que recebeu o Prêmio Nobel da Paz. Inclusive, se dispôs a receber o Prêmio Nobel da Paz ao lado de De Klerk, que era, na época, o presidente do regime do apartheid, do regime de minoria branca. Num gesto inigualável de boa vontade, de amizade e de solidariedade, conduziu o país a um tempo de paz e prosperidade. Mas isso é a exceção.
A Guiné-Bissau, mais uma vez, mostra ao mundo que os jovens africanos que vieram com aquelas idéias de regimes de Estado e de poder trazidas da Europa acabaram mergulhando o continente num banho de sangue, numa área geográfica onde havia, por exemplo… Na África do Sul existem 11 etnias, 11 línguas. Até hoje não se sabe muito bem o que é uma África do Sul. Existe Xhosa, existe Zulu, existe Sotho, existe Sepedi, existe Tswana. Só mesmo a liderança política do Presidente Nelson Mandela poderia realmente unir aquele Estado e fazer com que o país caminhasse para a prosperidade e para a paz.
Sr. Presidente, fica aqui, então, meu lamento, minha tristeza e o voto de pesar que apresento em nome do meu Partido ao povo da Guiné-Bissau, 1,5 milhão de habitantes, pelo brutal assassinato do seu Presidente, reeleito democraticamente, por conta desses conflitos internos, que um dia hão de acabar na África.
Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB – PI) – Eu gostaria de fazer umas indagações, já que V. Exª é um “africófono”, amigo da África e contribuiu com a cultura. Qual é a população da África toda, dos 40 países, mais ou menos?
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – A África tem 51 países, Sr. Presidente. E hoje são 600 milhões de habitantes, em torno disso.
O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB – PI) – São 600 milhões. E esses de cultura portuguesa – Angola, Guiné-Bissau, Moçambique – melhoraram ou pioraram depois de suas independências?
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – Melhoraram, mas viveram períodos de guerra de muitos anos. Moçambique viveu 20 anos de guerra entre dois partidos políticos, um de financiamento russo, que levou ao poder Samora Machel, assassinado num voo – explodiu o avião no alto. E Angola viveu 35 anos de guerra, com também dois partidos, um financiado pelos russos e outro com apoio americano, que dividiram o país durante muito tempo.
Depois que a guerra acabou, os países melhoraram. Mas deixaram resquícios da guerra imensos. Hoje ainda se anda em Angola e se vê em Luanda, por exemplo, na capital, milhares e milhares de mutilados. E ainda existem, nos campos, muitas minas enterradas.
Então, é a África inteira, não são só Angola e Moçambique, não são só os países de língua portuguesa, não, mas todos os países de colonização inglesa, francesa, todos eles viveram banhos de sangue de 60 para cá. O último país a ter a sua independência foi Botsuana, em 66, se não me engano. E todos eles, de 66 para cá, viveram conflitos internos enormes, por conta de saber qual daquelas tribos, naquele espaço geográfico, iria assumir o poder.
Muito obrigado, Sr. Presidente.