Realmente, hoje, pela sua luta, pela sua trajetória, ele é uma unanimidade e o povo brasileiro se rejubilou com a cura milagrosa. Eu digo milagrosa porque ele foi tratado pelo laboratório da Suíça, o Laboratório Roche, com um remédio que era o mais avançado para aquele tipo de câncer. Ele foi tratado no MD Anderson, no Texas, que é o hospital que dispõe de maiores recursos para a pesquisa do câncer, desenganado. S. Exª foi tratado pelo Dr. Sugarbaker, que é especialista em câncer da região peritonial. Também esse nem quis operá-lo, porque disse que ele morreria na mesa. Aqui, no Brasil, os mais brilhantes e renomados médicos – Dr. Paulo Hoffmann e sua equipe, e o Dr. Kalil e sua equipe, do Sírio-Libanês – todos, em determinado momento, deram ao Presidente José Alencar, no melhor prognóstico, um mês de vida.
As células dos tumores metabolizavam num ritmo alucinante e cresciam. A recidiva era fulminante. Operações de 17 horas perdiam o efeito em três, quatro semanas, porque os cânceres voltavam, os tumores voltavam. E quando já não havia mais esperança na ciência, de repente, o Vice-Presidente José Alencar reagia. E, daqueles tumores todos, no exame de agora, dia 10 de março, restava um que chegou a 14 centímetros. E, agora, no exame do dia 10 de março, tinha apenas um centímetro. Ele engordou, todos os seus exames clínicos mostram uma cura. E os próprios médicos – no último exame do dia 10 de março havia seis médicos. Então o Dr. Kalil falou em milagre. O Dr. Kalil é um cientista, mas ele falou em milagre seis vezes. E o Presidente José Alencar perguntou a essa Junta Médica brilhante, de homens notáveis, dos maiores do seu tempo, da Medicina do nosso tempo, se havia um caso semelhante ao dele, se eles tinham conhecimento como estudiosos. E eles disseram que não, que não havia nenhum caso semelhante ao dele. Esses tumores, esse tipo de câncer é fatal, leva ao óbito. E o Presidente foi salvo pela mão de Deus.
Então, feita esta pequena ressalva, Sr. Presidente, eu gostaria de ocupar esta tribuna, em rápidas palavras, para prestar uma homenagem ao Poder Judiciário.
Quando lá no final do século XVI, início do século XVII, as mentes potentes de Locke, de Rousseau e de Montesquieu imaginaram a repartição dos poderes – Legislativo, Executivo e Judiciário, logo viram que, pelo espírito de continuidade, pelo espírito de permanência, caberia ao Poder Judiciário na República, na organização do Estado, na… Eu diria, na coroa das instituições, uma posição extraordinária. E é realmente o Poder Judiciário aquele poder que tem a capacidade de conter, na evolução e nos processos de crescimento, de engrandecimento das nações, as explosões dos seus conflitos ideológicos.
O Poder Judiciário cumpre no mundo um papel extraordinário. O que seria do Brasil, Senador Mão Santa, sem os nossos homens da Magistratura? Eles são a expressão máxima da nossa cidadania. Eles são a expressão do arcabouço jurídico que nos norteia, que nos dá a todos o senso de cidadania.
Todos se lembram de quando surgiu a primeira Constituição e dos primeiros passos da democracia, não da Grécia, não de Roma, mas do mundo moderno, nos Estados Unidos. Lá, Senador Mão Santa, quando se reuniam na Virginia os Marshall, George Washington, Jefferson… E, quando a gente fala de Thomas Jefferson, a gente fica realmente enternecido com a figura daquele grande americano, que foi embaixador, homem público, escreveu os direitos do homem e que foi copiado por todas as constituições votadas democraticamente no mundo. É um texto que, embora tenha mais de 200 anos – bem mais que isso – é moderno, expressa uma vitalidade extraordinária.
Pois bem, Thomas Jefferson depois fez uma conferência a um brasileiro, quando era embaixador na França, e inflamou esse brasileiro, que voltou para o Brasil e aqui pregou a nossa Independência. E ali se deram os primeiros passos da República. Thomas Jefferson ia influenciar muito a Constituição francesa, mas, nessa ocasião em que o Estado americano nascia, a Suprema Corte americana passou a ter um papel extraordinário.
Senador Mão Santa, V. Exª lembra quando um juiz obscuro, anônimo, de uma cidadezinha chamada Sicura, lá no interior dos Estados Unidos, deu uma sentença? Veja bem, um juiz que não tinha sequer um automóvel, um juiz que andava de bicicleta… Pois ele proferiu uma sentença determinando que o Presidente da maior nação do mundo, Richard Nixon, revelasse o que havia, o que escondia, aquilo que ele guardava a sete chaves das fitas, das gravações em que ele invadia as prerrogativas de um outro poder. A sentença do juiz de um município americano, de uma cidade, de um condado, de uma província… E o presidente da maior nação do mundo achou mais digno, achou mais honrado renunciar, porque ele sabia que a Suprema Corte americana iria apoiar aquele juiz. E caiu, caiu o Presidente dos Estados Unidos com a sentença de um juiz que pouca gente conhecia, de um homem que andava de bicicleta, mas que estava ali exercendo a sua magistratura.
Veja, Senador Mão Santa, como é importante, numa nação que se quer culta, poderosa, rica, mas também humana e justa, a ação de um Poder Judiciário. Nós, que somos do Legislativo, devemos prestar homenagem.
Todos se lembram de quando a magistratura unificada do nosso Império era prepotente e orgulhosa e como custou aos homens de grande saber, como este que está aí, que, com seu verbo potente…
O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC – PI) – Ele disse que só há um caminho e uma salvação: a lei e a justiça.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – Pois é. Com a sobranceria do seu caráter, com seu verbo potente, foi Rui Barbosa…
O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC – PI) – Mas, antes de Thomas Jefferson, eu queria apenas… Eu tenho a mesma vibração de V. Exª por Thomas Jefferson, mas o mais belo é o que está escrito no túmulo dele…
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – Numa pequena lápide.
O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC – PI) – Ele que foi isso tudo que V. Exª disse. Atentai bem: “Aqui jaz o fundador da Universidade de Virginia”…
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – Da Universidade de Virginia.
O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC – PI) – ,…mostrando que a sabedoria…
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – Foi o homem que participou da fundação de Washington, foi o homem que participou da fundação do Senado americano…
O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC – PI) – Foi o fundador da Universidade de Virginia, mostrando o valor do saber, da sabedoria.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – Sem sombra de dúvida, Senador Mão Santa. Ele queria ser conhecido pelos vindouros, pelos seus pósteros, como o criador da Universidade de Virginia.
Mas V. Exª sabe que, quando Rui Barbosa discutia com Pedro Lessa –discursos célebres sobre o habeas corpus –, Lessa defendia que esse habeas corpus deveria defender o ir e vir. Rui queria ampliar para todos os direitos consagrados, para todos os direitos legítimos do homem que tivessem sido aviltados pelo Estado. Isso depois foi ser consagrado no mandado de segurança.
Rui Barbosa perdeu, mas deixou para nós, fez penetrar na consciência nacional o acatamento às decisões dos tribunais íntegros e livres, o amor, o respeito à voz das urnas, a devoção sacral à vontade soberana do povo, expressa na sua decisão de um voto livre. Rui Barbosa preferiu o exílio, o degredo a ver o perjúrio da nossa Constituição. Rui nos legou páginas imortais, lições imortais na constituição da cidadania e da Nação brasileira.
Não quero ser fastidioso, mas quero lembrar aqui uma objurgatória de Octávio Mangabeira.
O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC – PI) – Permita-me entrar aqui. É como diz nosso Mercadante: “é o debate qualitativo e histórico”.
Rui Barbosa, no início da nossa República, sofreu um exílio, o nosso Marechal de Ferro. Ele esteve em Buenos Aires. Então, ele aprendeu com a cultura inglesa que, muito antes do liberdade, igualdade e fraternidade, da tripartição do Poder, a que V. Exª se referiu, de Montesquieu, ali por volta de 1789. Mas muito antes, em 1660, a Inglaterra… Daí o Rui ter trazido esse amor à lei. Entrou Carlos I numa guerra. Ele tinha fechado o Parlamento, que já existia. Era uma democracia monárquica, bicameral. Mas aí ele teve dificuldade, não teve credibilidade para conseguir da população dinheiro para enfrentar uma guerra com a Irlanda e a Escócia. Aí foi buscar o Líder do Parlamento: Emily Crown. Ele reabriu mas impôs ao rei que jamais – ele abriu, trouxe os líderes, que somos nós, hoje; lá é bicameral, Casa dos Lordes e dos Comuns – um rei estivesse acima da lei. Daí o rei lá se curvar aos Parlamentos, que hoje nós representamos.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – Muito bem, Senador Mão Santa. A intervenção de V. Exª abrilhanta o meu pronunciamento.
Mas eu gostaria de retomar, e já concluirei, com a objurgatória de Octávio Mangabeira, que, no seu célebre discurso sobre Rui Barbosa, na sua conferência sobre Rui Barbosa, defendia a tese de que o problema do Brasil, problema dos brasileiros, é que, nos momentos supremos da Nação, o Judiciário se omitia, se calava. Eu não sei se hoje ele assinaria.
Mangabeira era um homem espetacular, foi um sujeito que conseguia, com uma visão humanista, interpretar os momentos mais difíceis da nossa sociologia. Não sei se ele faria o mesmo. O Judiciário foi aviltado na época de Getúlio. Eles sofreram, para a instalação da ditadura, demissões, foram aposentados compulsoriamente. Na época do regime militar ocorreu a mesma coisa. E hoje nós temos um Poder Judiciário que evoluiu, que tem prestado a esta Nação relevantes serviços e que organizou e opera um Conselho Nacional de Justiça que nos enobrece e nos dignifica a todos.
Esses dias, pensando sobre as coisas dos royalties, eu vi o parecer de três juristas – e é aqui que quero concluir este meu pequeno pronunciamento. Falava Sepúlveda Pertence, alta estirpe. Ele dizia o seguinte: os royalties não são uma compensação financeira por um bem que pertence à União. A Constituição é clara: o petróleo, os bens, as riquezas minerais pertencem à União, de tal maneira que os royalties não devem ser uma compensação daquilo que não lhe pertence, que não pertence aos Estados e aos Municípios. Eles são uma compensação pelos efeitos socioeconômicos e também ambientais que ocorrem e que, às vezes, são difíceis de serem previstos.
Mas ouvi também a voz do Ministro Jobim, que contou uma coisa interessante. Ele disse que, na Constituição, quando os Parlamentares, quando os Constituintes se reuniram, eles disseram e chegaram à conclusão de que o petróleo era da União e os investimentos para extraí-lo também eram da União. As plataformas de petróleo, os dutos, os cargueiros, os petroleiros, como também as hidrelétricas do Pará e do Paraná onde se obtinha a energia elétrica. No caso do petróleo, há exaustão; no caso da energia elétrica, não há porque a água continua correndo. Pois bem. Mas eles disseram o seguinte: nós não daremos o ICMS a esses produtores da energia. Nem ao Pará, nem ao Paraná, pelas hidrelétricas, e nem ao Rio de Janeiro, pelo petróleo, mas vamos compensá-los com royalties.
Essa é uma coisa que precisamos lembrar nesta Casa da Federação. Isso foi dito por um Constituinte e é assim hoje. O ICMS do petróleo não é pago na extração do petróleo, mas no refino, o que até causa, como efeito colateral, uma concentração de riqueza e poder em São Paulo, que tem as maiores refinarias do Brasil.
Com o Presidente Lula, agora vamos ter refinaria no Ceará, no Maranhão, em Pernambuco, no Rio se está construindo outra. Mas até que isso ocorra, São Paulo é o grande beneficiado com o ICMS do petróleo, o que traz prejuízos para o Pará e Paraná. E a compensação? A compensação era o royaltie.
Há um outro jurista, constitucionalista, de São Paulo, que tem uma outra visão. Ele diz o seguinte:
o Constituinte não quis tirar da União a riqueza, mas não permitiu que ela detivesse a exploração econômica dessa riqueza, por questões de fortalecimento da nossa Federação.
E, nesse aspecto, Senador Mão Santa, o povo brasileiro sempre levantou bem alto a bandeira de sua liberdade. Os Estados que formam a Federação brasileira sempre quiseram manter a sua individualidade, sua maneira de ser, seu regionalismo na comida, na música, na maneira de ver o mundo e também, eu diria, nas características de seu relevo, de sua geografia, de seu subsolo.
O espírito da Federação que une todos os brasileiros é algo muito acima das cláusulas pétreas da Constituição. Seria um pecado mortal. Eu até às vezes me pergunto: se matéria que avilta os direitos dos entes federativos deveria tramitar nesta Casa. Acho que nem deveria tramitar, porque, acima de qualquer distribuição ou de qualquer valor, existe um valor maior que a todos precede e sobrepõe, que são os direitos federativos da nossa União.
Que seja respeitado o Piauí, porque amanhã pode-se descobrir uma grande reserva de urânio ou de platina, que hoje vale mais do que o ouro, e o Piauí terá de ser respeitado nas suas jazidas. Que sejam elas para o bem do Brasil, que até se divida pelo Imposto de Renda, pelos Fundos de Participação dos Municípios e dos Estados, mas jamais poderemos, criando uma maioria eventual, com objetivos econômicos e eleitorais, esmagar o direito de uma minoria, porque o custo disso será implantar no Brasil o ódio, a mágoa, o ressentimento entre os irmãos.
Lembro-me de Rui, que dizia e que nos deixou a lição imortal de horror a todos os tipos de tirania, que se extravasam sempre na intolerância, na truculência e, não raro, no sangue.
Então, deixo aqui as minhas reflexões. Confio no alto espírito de ponderação, de tolerância, de indulgência do Senado Federal. E tenho certeza de que vamos construir uma fórmula e que nenhum Estado perca. Não é para perder. As reservas de petróleo, segundo os pessimistas, são de 30 bilhões de barris. Os otimistas falam em 200 bilhões de barris. O Governo trabalha com 60, 70 bilhões de barris. Todo esse petróleo não deve causar entre nós nenhuma cizânia, nenhum ódio; pelo contrário, deve nos unir na construção de um Brasil que todos queremos, seja rico, seja poderoso, seja culto, mas, como disse também, humano e justo.
Gostaria, antes de terminar, de lembrar aqui que fiz uma homenagem à magistratura e queria prestar uma homenagem a um Ministro do Rio de Janeiro, prestando serviço à Nação, aqui em Brasília, no Superior Tribunal, o Ministro Fuchs, que correu todo o Brasil para apresentar o projeto de um novo Código Penal.
O nosso Código Penal, todos sabem, é de 1940 e que não acompanhou as nossas evoluções, os nossos processos de evolução econômica e social. E, agora, nós temos um anteprojeto que podemos estudar, aperfeiçoar, relatar, votar, pautar e, finalmente, aprovar para que o povo brasileiro disponha de um instrumento eficaz, idôneo, eficiente, para que nós possamos conduzir esta Nação nos caminhos da justiça e da liberdade. Então, eu quero prestar homenagem a este grande jurista da minha terra, o Ministro Fuchs, por esse trabalho, que é o 13º trabalho de Hércules. É um trabalho imenso, enorme conseguir juntar a contribuição de tantas mentes, de tantas correntes, para nos dar um Código que seja moderno.
Agora mesmo, Senador Mão Santa, as pessoas em nosso País estão perplexas, e muitas delas até, eu diria, inconformadas, porque, nesse crime bárbaro que levou a vida de uma criança inocente, os pais poderão sair da prisão – a mãe, com oito anos de prisão. E eu fico a me perguntar: meu Deus, se alguém que comete um crime hediondo, tão contra a natureza, tão contra tudo em que nós acreditamos e respeitamos e cultuamos, ofendendo, rasgando a Bíblia do primeiro ao último livro, pisando nos mandamentos, nos ensinamentos cristãos… Será que apenas oito anos é uma pena justa? Pois é, mas é isso que o nosso Código prevê.
Era o que eu tinha a dizer.
Muito obrigado, Senador Mão Santa.