O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ. Como Líder. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, senhores telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, senhores e senhoras que abrilhantam esta sessão com sua presença, boa-tarde.
Sr. Presidente, hoje, na reunião do Conselho Político com o Presidente da República, foi discutido aquilo que eu tenho aqui, de muito tempo, clamado, um pedido que tenho proclamado insistentemente ao Governo brasileiro: que ele adote um amplo programa de habitação. Um programa de habitação que possa resgatar o déficit habitacional que temos e que persiste no espaço, que persiste há décadas em nosso País.
Em 1970, o Brasil tinha um déficit habitacional um número oficial que se falava na política, na imprensa de sete milhões de habitações. Hoje, Sr. Presidente, passados mais de trinta anos, ainda se fala no mesmo número. O déficit habitacional no Brasil é de sete milhões de unidades.
Não sei se esse déficit inclui as casas nas comunidades carentes, nos assentamentos precários, nas periferias das grandes cidades brasileiras, mas me parece que não, Sr. Presidente. Só na cidade do Rio de Janeiro, na capital do meu Estado, temos aproximadamente mil comunidades carentes, e, nessas mil comunidades carentes, moram mais de um milhão de pessoas. E é nesse local, nessas condições improvisadas, precárias, doloridas, amargas de vida que temos hoje a proliferação do tráfico de drogas, do crime, temos ali violência, balas perdidas, invasões que a polícia realiza, a meu ver, muitas delas sem obter o êxito necessário.
Nesse enfrentamento, as balas perdidas matam inocentes, e não sei se a morte de um 0inocente, Sr. Presidente, compensa uma boca de fumo estourada. Eu preferia que as ações fossem muito mais de inteligência, que as Forças Armadas ocupassem as fronteiras brasileiras, conforme lei votada pelo Congresso Nacional, votada nesta Casa. Faço aqui uma menção de justiça ao falecido Senador Antonio Carlos Magalhães, que foi, junto comigo, Relator dessa lei complementar que trata do emprego e do adestramento das Forças Armadas, na qual fiz uma emenda que confere poder de polícia federal às Forças Armadas na fronteira, ou seja, a Aeronáutica, no espaço aéreo brasileiro, passa a ter as funções de polícia federal; a Marinha, no litoral; o Exército brasileiro, nas nossas fronteiras secas. E é aí, Sr. Presidente, por onde passa o grande flagelo que são as drogas.
Agora mesmo, na nossa fronteira do Brasil com Bolívia, Colômbia, Peru, Paraguai e essa fronteira brasileira é formada, na maior parte, por uma mata espessa, por montanhas muito altas e um deserto demográfico , pode ter certeza, Sr. Presidente, de que ali está passando uma caravana de mulas, escondida pelas copas das árvores, trazendo esse flagelo que é a cocaína e que vai suprir aqui o narcotráfico.
Pois bem, Sr. Presidente, mas toco nesse assunto porque o que me interessa falar aqui, mais uma vez, é o programa de habitação.
É preciso que o Brasil, que nós brasileiros façamos aqui um cimento social, possamos unir esses dois Brasis. De um lado, um país culto, dinâmico, um país que tem lazer; que mora bem; que é bonito; que tem condições cultas e saudáveis de vida. E a uma distância constrangedora, nós temos um outro Brasil, com uma população levando uma subvida, em condições sub-humanas, muitas vezes passando fome, com suas crianças adoecendo, em péssimas condições de habitabilidade. Esses barracos nas favelas, cenário que eu observo desde a minha infância, em minha cidade e em outras cidades brasileiras, é, hoje, a maior vergonha da cidadania. Nós, políticos, esta Casa, sobretudo o Governo, não podemos nos conformar que um País que tem calcário e argila, portanto, cimento; um País que tem um pólo petroquímico, portanto, tintas, vernizes, plásticos, borracha; um País que tem alumínio, que tem minério de ferro, exporta para o mundo inteiro, portanto, tem vergalhões, tem barras de aço, tem perfis de todo o tipo; que tem um quadro de engenheiros – o Confea, o maior Conselho profissional do mundo; um País que tem uma mão-de-obra ociosa, abundante, esperando ser treinada e empregada, com a ansiedade de um vigia que aguarda a alvorada, a esta altura de nosso desenvolvimento econômico, ainda tem amplas parcelas de população vivendo em barracos?! Nos falta argila para produzir telhas e tijolos? Nos falta madeira para fazer escoramento dessas telhas e cobrir essas casas com treliças, com tesouras, com estrutura de telhado? Nos falta plástico ou PVC para fazermos tubulações? Nos faltam metais para fazermos fios, cabeamentos? Não, Sr. Presidente, o que nos falta é tomar a decisão política.
E é isso que hoje eu vi na reunião de que participei no conselho político do Senhor Presidente da República, em que ele disse que a equipe econômica do Governo está estudando um efetivo e, na escala da nossa necessidade, programa de habitação para ser implementado nos próximos anos. Os recursos do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social, lei votada nesta Casa, aliás, o Senado Federal bateu recorde. Essa lei, Sr. Presidente, é a primeira lei de iniciativa popular depois da Constituição de 1988. O povo brasileiro se reuniu e conferiu um milhão e meio de assinaturas para o primeiro projeto de iniciativa popular depois da Constituição de 1988. Uma dessas assinaturas, inclusive, do então metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva, hoje Presidente da República! E o que pedia essa lei de iniciativa popular com amplo apoio da população brasileira? A recriação do BNH, de um banco de habitação.
O Governo não fez isso, mas criou um sistema – um sistema e um fundo – Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social e o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social. O Fundo hoje dispõe de pouco mais de um bilhão. É pouco! Nós precisávamos fazer um milhão de casas antes do término desse Governo. E se colocarmos ao preço de R$20 mil uma casa popular, estaremos falando de R$20 bilhões. É disso que nós precisamos, Sr. Presidente. E não dependemos em nada de recursos do exterior. Temos tudo para que isso seja feito e para que o povo brasileiro possa ter condições melhores para sobreviver e criar seus filhos.
Sr. Presidente, a primeira favela brasileira surgiu na Guerra do Paraguai. Não me canso de contar esta história aqui da tribuna porque espero – como João Batista clamava no deserto – que isso toque a consciência do povo brasileiro. Aliás, o Cimento Social é isto, é unir esses dois brasis. Hoje, as pessoas passam em frente a uma favela e não veem que aquilo lá é um monumento hediondo, que, infelizmente, está-se transformando em um monumento perpétuo da desigualdade entre nós, brasileiros. É algo que nos envergonha a todos.
Pois bem, Sr. Presidente, a primeira favela surgiu com escravos que foram à Guerra do Paraguai como voluntários, os Voluntários da Pátria – lei de D. Pedro II, que foi publicada no Jornal do Commercio, no Rio de Janeiro, e imortalizada em avenidas de todas as capitais, nas grandes cidades. Em Teresina, no Piauí, há a avenida Voluntários da Pátria; no Rio de Janeiro, tem em Botafogo a rua Voluntários da Pátria. Em todas as cidades há homenagem a esses soldados, a maioria escravos que foram à Guerra do Paraguai com a promessa de voltarem e terem alforria. Tiveram alforria, mas sem trabalho e sem moradia. Foi dada a eles, porque voltaram ao porto do Rio de Janeiro, autorização de ocuparem provisoriamente, Sr. Presidente, o morro da Providência.
Quero pedir a V. Exª que estenda meu tempo por mais três minutos e eu já concluirei, Sr. Presidente. Fico muito agradecido.
O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB – PI) – Está no livro de Deus: “pedi e dar-se-vos-á”.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB – RJ) – Muito obrigado, Sr. Presidente.
Então, voltam ao Rio de Janeiro em 1870. A Lei do Ventre Livre só viria em 1871. Nessa ocasião, Nabuco, Patrocínio e Princesa Isabel tentavam nos redimir da vergonha extrema da escravidão que em 350 anos mancharam as páginas da história deste País.
Sr. Presidente, voltam 30 mil soldados, voluntários da Pátria, encontram alforria, mas sem trabalho e sem moradia, e vão ocupar, provisoriamente, o chamado morro da Providência, no Rio de Janeiro. E por que se chama morro da Providência? Porque se esperava que o Governo de então, o Governo do Imperador Dom Pedro II, tomasse uma providência.
Sr. Presidente, 130 anos se passaram e o morro da Providência até hoje aguarda essa providência. Até hoje, as casas são malfeitas, as casas são invadidas por todo tipo de pestes, ratos, baratas, lagartixas, as crianças têm problemas de verminose, ali não há um adequado abastecimento de água, coleta de lixo, distribuição de energia, tratamento de esgoto. Não há, nas universidades brasileiras, uma house dedesign para nós pensarmos a vida nas comunidades: a acessibilidade, os móveis internos, as geladeiras, os fogões. Precisa haver uma linha para assentamentos populares, para comunidades carentes. Não somos capazes, Sr. Presidente, de nos organizar sequer para dar energia solar a esses brasileiros mais pobres, trabalhadores, lutadores, desde a época da Guerra do Paraguai, para eles poderem, à noite, tomar um banho com água quente.
Sr. Presidente, é nesse sentido que, mais uma vez, ocupo esta tribuna. E quero, desta vez, parabenizar o Governo pelo anúncio desse promissor e auspicioso plano de habitação. Espero, Sr. Presidente, que essas medidas sejam implementadas e que tenham o apoio do Congresso e da sociedade. Essa é uma dívida histórica que temos com os nossos irmãos, que crescem, sobretudo as crianças, com o estigma de serem cidadãos de segunda qualidade, com o estigma de inferioridade, por não terem sequer uma casa decente para morar. Esperamos, Sr. Presidente, que esse programa de habitação possa vir para, no mínimo, atender a um milhão de famílias antes do final deste Governo.
Muito obrigado, Sr. Presidente.