A formação de uma comissão de juristas para elaborar um anteprojeto de Estatuto da Pessoa com Deficiência foi sugerida pelo desembargador do Tribunal Regional do Trabalho (TRT), da 9ª Região (Paraná), Ricardo da Fonseca. Ele participou do 6º Fórum Senado Debate Brasil, realizado no Auditório Petrônio Portela. O encontro tem como tema a Convenção da Organização das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
Na avaliação do desembargador, o Estatuto é necessário até para que os juízes possam conhecer a legislação que se refere às pessoas com deficiência. Grande parte dos magistrados, segundo disse, não conhece as leis sobre o assunto e nem a Convenção da ONU.
Aprovado pelas Nações Unidas em 2006, o documento foi ratificado pelo Brasil em 2008, por meio do decreto legislativo nº 186, e confirmado pelo decreto do Executivo nº 6.949 de 2009. Como se trata de um acordo internacional na área de Direitos Humanos, aprovado por maioria de três quintos em dois turnos de votação na Câmara e no Senado, o documento tem status de Emenda Constitucional e só pode ser modificado por outra emenda à Constituição.
O desembargador afirmou considerar que o projeto do senador Paulo Paim (PT-RS) instituindo o Estatuto da Pessoa com Deficiência, já aprovado pelo Senado e em exame pela Câmara dos Deputados (PLS 6/2003, no Senado, e PL 07699/2006, na Câmara), carece de regras de codificação, o que, segundo ele, necessita do trabalho de pessoas com experiência na área.
Ricardo Fonseca admitiu haver um movimento contrário à aprovação do estatuto na forma como está no projeto que tramita na Câmara, integrado inclusive por pessoas com deficiência, mas informou que, na última conferência desse segmento, houve deliberação a favor da criação de um estatuto.
Para incentivar a inclusão no mercado de trabalho de pessoas com deficiência, o desembargador defendeu a adoção do “contrato de aprendizagem”, mecanismo pelo qual a empresa contrata a pessoa nessa situação e promove a sua capacitação em seu interior e não externamente, “em guetos”. Experiência com esse sistema foi implantada em Curitiba, com apoio do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac) e uma Organização Não Governamental.
Dados do Ministério do Trabalho indicam, segundo o palestrante, que 348 mil pessoas com deficiência estão empregadas no país, número que, em sua avaliação, poderia chegar a cerca de 800 mil nas empresas e outras tantas na administração pública, caso houvesse maior incentivo à inclusão.
O desembargador disse que o maior problema para contratação é o nível educacional desse segmento – uma média de 2 anos e oito meses, segundo o Censo de 2000. E é porque a sociedade não foi capaz de educar, como ressaltou, que existe a lei de cotas. Ele disse ainda que as empresas estão fazendo exigências excessivas para contratação dessas pessoas.
O desembargador também criticou projeto (PLS 112/2006), de autoria do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-MA), que, em sua opinião, representará um retrocesso na lei de cotas para pessoas com deficiência. Isso porque, como explicou, em vez de cumprir a cota a empresa poderá pagar uma verba para profissionalização da pessoa, ou contratar terceirizados. Para ele, a proposta é um equívoco e fere a Constituição e a Convenção da ONU. A proposição tramita na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).
Ricardo Fonseca criticou também o modelo assistencialista em vigor que, em sua opinião, acaba afastando as pessoas com deficiência do mercado formal de trabalho. Muitos, como afirmou, preferem optar por receber o “benefício da prestação continuada” e ter um emprego informal a correr o risco de entrar no mercado formal, ficar desempregado e perder o benefício. Previsto na Constituição, o BPC equivale a um salário mínimo mensal e é concedido à pessoa com deficiência e ao idoso carente.
Como alternativa, ele sugere a criação de um benefício previdenciário, a ser pago como salário suplementar para as pessoas com deficiência que trabalham, sistema que, em sua avaliação, incentivaria a inclusão e aumentaria a contribuição para a seguridade.
Ele sugeriu ainda a adoção do modelo do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) para melhorar a fiscalização e o monitoramento das questões relacionadas às pessoas com deficiência.
A preocupação com o modelo institucional de monitoramento da implantação dos dispositivos da Convenção da ONU e de integração de políticas públicas na área da pessoa com deficiência também foi manifestada pelo ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Joelson Dias.
Em sua a avaliação, o governo avançou ao criar a Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência para cuidar no âmbito nacional da implantação de medidas para essas pessoas. Mas questionou se esse órgão deveria ser também o responsável pela função de integração das políticas públicas.
O ministro afirmou ser necessário que as pessoas com deficiência conheçam o conteúdo da Convenção e do Protocolo Facultativo (ratificado também pelo Brasil e que permite denúncias à ONU) para que possam reivindicar das autoridades a efetivação dos dispositivos dos documentos. Ele também recomendou que em todas as reivindicações de causas na Justiça se faça referência à Convenção.
Questionado por uma participante do encontro sobre a adoção de medidas para facilitar o voto das pessoas com deficiência, ele informou que a Justiça Eleitoral tem reivindicado dos governantes a implantação de seções adequadas às normas de acessibilidade. Mas disse ser necessário avançar para que todas as sessões eleitorais sejam universalmente acessíveis.
Representante do ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria de Direitos Humanos, José Rafael Miranda, disse que a Secretaria de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência foi criada pelo governo federal para implementar a Convenção da ONU. Ele afirmou ainda que foi instituída, em 2007, a agenda social do governo federal para a cidadania das pessoas com deficiência.Informou que têm sido realizadas também campanhas nos meios de comunicação para incentivar a acessibilidade e o respeito a essas pessoas.
(Agência Senado)