O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL – RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, que honra. V. Exª sabe que tenho um projeto nesta Casa que diz o seguinte: “Que todo servidor público, antes de ter seu título nominado em correspondências ou mesmo em solenidades como esta, deveria ser precedido pela palavra servidor”. Então ficaria: senhor servidor Senador, senhor servidor Presidente da República, certamente para não esquecermos a quem servimos. E, seguramente, devemos servir, principalmente, às nossas crianças.
Quero saudar, Sr. Presidente, o Ministro Lélio Bentes, o Dr. José Carlos Ferreira, representante da OIT (Organização Internacional do Trabalho), e também a Dona Gladys Buarque, Presidente da Missão Criança.
Srªs Senadoras, Srs. Senadores, senhores convidados, que honra tê-los aqui, no nosso plenário.
Sr. Presidente, serei muito breve.
V. Exª sabe, eu passei quase dez anos na África e vi coisas horríveis, principalmente a Aids, o apartheid, a luta dos negros para sobreviver num país de tantas guerras e tanta discriminação, crianças vivendo numa situação horrível… No entanto, nunca vi, nos dez anos em que passei na África, entre Malawi, Zâmbia, Quênia, Uganda, Madagascar, o que vi nas comunidades pobres do Rio de Janeiro, especialmente no passado, quando fui candidato a Prefeito do Rio, crianças de 13 a 15 anos, ao que me parecia, vendendo drogas em plena luz do dia. Nunca vi isso em nenhum país da África.
Quando morei em Moçambique, aquele era, segundo a Organização das Nações Unidas, o país mais pobre do mundo, que estava vindo de uma guerra fratricida de vinte e sete anos, entre a Frelimo e Renamo, mas nunca vi na África o que vi no Rio de Janeiro.
Sr. Presidente, este é o País da desigualdade social. Ao mesmo tempo, temos sete mil famílias brasileiras que detêm hoje, nos bancos privados e públicos, R$800 bilhões e nos exigem 19,5% de juros ao ano. Se o Presidente Lula, que criticamos muitas vezes pela política econômica, começar a baixar esses juros, V. Exªs poderão observar que haverá a fuga de capitais, porque tiram dinheiro dos bancos, trocam em dólares e mandam para fora. Aliás, quando nosso Governo assumiu, havia uma fuga de capitais de US$2 bilhões por dia.
Aí está a raiz de todos os crimes contra os direitos humanos, que atormentam o cotidiano dos brasileiros: poluição, discriminação, riqueza, opulência, miséria, falta de condições de saneamento e habitação e, principalmente, o desprezo com que tratamos as nossas crianças.
Mas o povo brasileiro não é assim. Quero dar um testemunho. Quando voltei da África, fui morar em Irecê, na Bahia, a 650 km de Salvador, e encontrei a mesma coisa mencionada pela Senadora Heloísa: crianças quebrando pedra. Lembro-me daqueles povoados pobres ao redor de Irecê. Perguntei a uma menina: você não tem um brinquedo? Ela me disse: olha, pastor, quando dá três horas da tarde é uma fome danada, não tem nada para comer. Lá em casa a gente come pela manhã e depois a gente come o que consegue na rua. Saí dali, porque ela estava quebrando pedra, fazendo brita daquelas pedras maiores que ficam na superfície do terreno, aluvião, e fui à casa dela. Verdade! Encontrei uma caixa de papelão com cenouras velhas, moles, um horror.
Muito bem. Comecei a sair cantando pelo Brasil, assinei um contrato com a Sony e, em menos de dois anos, Senadora Heloísa Helena, eu tinha arrecadado de venda de CDs, shows, e direitos autorais, R$10 milhões, que foram aplicados na fazenda Nova Canaã, onde já há três ou quatro anos 540 crianças têm ônibus, têm escola, não precisam trabalhar, vivem muito bem, graças a Deus.
Senhores, não era um Senador, era um cantor! Que consegue manter 540 crianças na escola, 100 hectares irrigados, dezenas de famílias assentadas. E o nosso Governo não consegue? Será que não podemos dar pré-escola, e foi exatamente a isto a que me ative na fazenda, pegar crianças de dois a seis anos porque não têm assistência do Município nem do Estado, nem do Governo Federal. Heloísa, temos 110 mil igrejas católicas neste País e 12 mil padres! Olha que coisa interessante: 100 mil igrejas católicas mas só 12 mil padres. A maioria das igrejas está sendo tocada por leigos.
(Interrupção no som.)
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL – RJ) – Sr. Presidente, prometo que completo no tempo que V. Ex.ª me permitiu, em um minuto. E 60 mil igrejas evangélicas! Ao todo, 160 mil templos. Quando é que enchem? Sábado, domingo ou quarta-feira à noite. Será que não temos prontas 160 mil creches para cuidar das nossas crianças? Claro que temos. Será que não temos? Claro que temos. Só no ano passado pagamos de juros cento e trinta bilhões, cento e onze bilhões para aqueles sete mil brasileiros e mais oitenta bilhões de superávit.
Sr. Presidente, desculpe-me em uma solenidade tão bonita fazer um desabafo, mas quero me ombrear com meus companheiros que com tanta dignidade e amor lutam todos os dias contra as desigualdades sociais do nosso País denunciando, falando isso aqui abertamente, prontos para o debate, querendo ser convidados para discutir essas questões porque é a vida das nossas crianças que está em risco.
Termino dizendo o que disse Jesus: “Bem-aventurados aqueles que aceitam essas crianças porque quem aceita os pequeninos – e deles é o reino dos céus – aceita a mim”.
Muito obrigado. (Palmas.)