O Republicanos, sigla que integra o segundo maior bloco da Câmara com partidos da base do governo Lula, apresentou um projeto de lei que prevê anistia a pessoas presas em manifestações de cunho político desde o segundo turno da última eleição presidencial. O texto, assinado pelo deputado federal Marcelo Crivella (Republicanos-RJ), mira especialmente os presos no acampamento diante do Quartel-General do Exército, em Brasília, no dia seguinte aos atos golpistas do dia 8 de janeiro. De acordo com Crivella, a anistia não abarcará pessoas flagradas cometendo atos de violência, tampouco autoridades que possam ser responsabilizadas por omissão.

O projeto foi avaliado em reunião da bancada do Republicanos nesta semana, antes de ser protocolado por Crivella. O texto diz que ficam anistiados aqueles que “participaram de manifestações com motivação política e/ou eleitoral, ou as apoiaram, por quaisquer meios, inclusive contribuições, doações, apoio logístico ou prestação de serviços e publicações em mídias sociais e plataformas”. A justificativa apresentada pelo deputado, que é ex-prefeito do Rio e bispo licenciado da Igreja Universal, cita outras anistias concedidas em governos petistas, por exemplo, a servidores dos Correios e policiais e bombeiros militares envolvidos em paralisações.

Segundo o texto, “para refutar a ideia de condescendência com as imagens mostradas nos meios de comunicação de massa da invasão e dano aos prédios públicos”, o projeto impede a anistia no caso de pessoas investigadas por crimes como lesão corporal, dano ao patrimônio público, incêndio e explosão.

Também não poderão ser anistiados aqueles que fizeram doações superiores a R$ 40 mil para o financiamento dos atos, além de agentes de segurança que tenham cometido infrações “com motivação político e/ou eleitoral”.

A apresentação do texto ocorreu no mesmo dia em que imagens de câmeras do Palácio do Planalto gravadas no dia dos atos golpistas, e divulgadas pela CNN nesta quarta-feira, mostraram integrantes do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) circulando entre manifestantes que haviam invadido as dependências do Poder Executivo. As imagens levaram à exoneração do ministro do GSI, general Gonçalves Dias, e deram fôlego à instauração da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos atos de 8 de janeiro, protocolada pela oposição a Lula e agora apoiada também pelo Planalto.

Segundo Crivella, seu projeto não conflita com a CPMI, mas pode “acalmar os ânimos” ao garantir a liberdade do que o deputado chama de uma “multidão de manifestantes pacíficos” que acabaram presos em um “efeito manada”. O objetivo da anistia, de acordo com o parlamentar, é tirar do caminho as “mágoas do passado”.

— Hoje, a oposição acusa a situação de ter feito todos os crimes para culpar os bolsonaristas. Minha anistia não se envolve nesse contexto. A CPMI fará a averiguação de financiamento, quebrará sigilos, mas tudo isso leva tempo. Enquanto isso, sentimos a necessidade de aliviar a dor de tantos presos, cujos parentes nos pedem providências. O acampamento era uma manifestação pacífica. Uma vez que essas pessoas voltem às suas vidas, creio que poderemos fazer uma CPMI mais técnica, sem tanta gritaria e aquele fogo todo do lado de fora. Tanto o governo quanto os bolsonaristas podem ser favoráveis — declarou Crivella.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciou mais de 1,3 mil pessoas pelos atos de 8 de janeiro, das quais 239 fazem parte do chamado “núcleo dos executores”, formado por presos na invasão à Praça dos Três Poderes. Outros 1,1 mil foram reunidos no “núcleo dos incitadores”, formado por pessoas detidas no acampamento em frente ao QG do Exército no dia seguinte. Desde janeiro, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, relator do inquérito, autorizou a soltura, através de medidas cautelares como o uso de tornozeleira eletrônica, da maioria dos denunciados. Após a análise de todos os casos, 294 pessoas permaneceram presas.

Nesta semana, o STF começou a analisar o primeiro lote de denúncias apresentado pela PGR, e já formou maioria para tornar réus cem acusados de participação em atos golpistas.

Além do aceno de “pacificação” no Congresso em meio à crise que levou à exoneração do ministro do GSI, o Republicanos, que fez parte da coligação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), tem feito outros gestos de aproximação com o governo Lula. Após a legenda aderir ao bloco na Câmara com partidos como MDB e PSD, e embora negue fazer parte da base do governo, lideranças do Republicanos especialmente de estados do Norte e do Nordeste vêm conversando com o Planalto sobre indicações para cargos no governo. No Rio, o diretório estadual do Republicanos foi assumido na semana passada pelo prefeito de Belford Roxo, Waguinho, marido da ministra do Turismo, Daniela Carneiro.

Outro projeto de Crivella, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que amplia a imunidade tributária de entidades religiosas, ganhou apoio de integrantes do PT, de olho em uma aproximação de Lula com o segmento evangélico. O deputado federal Silvio Costa Filho (Republicanos-PE), um dos integrantes da legenda mais próximos a Lula, deve ser o relator da proposta na Comissão da Constituição e Justiça (CCJ).

Fonte: O Globo