O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL – RJ. Como Líder. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, caríssimos telespectadores da TV Senado e ouvintes da Rádio Senado, ocupo a tribuna do Senado Federal para falar de um tema angustiante: o massacre ocorrido em meu Estado, na Baixada Fluminense, na noite da última quinta-feira, que vitimou 30 pessoas, sendo sete menores de 18 anos. Nunca havíamos vivido tal situação no Estado do Rio de Janeiro, cujo povo é cordato e amigo, sendo as pessoas simples, trabalhadoras, humildes, que não mantêm relação alguma com a violência. Não estão na alma do carioca acontecimentos como esse, que chocou a todos.
Na última quinta-feira, um grupo de assassinos, entre 20 e 22 horas, em uma extensão de 15 quilômetros, nos Municípios de Nova Iguaçu e Queimados, na Baixada Fluminense, matou 30 pessoas inocentes, entre criança, estudante, comerciante, desempregado, funcionário público, marceneiro, pintor e garçom. Sete eram menores. Os tiros foram certeiros, disparados por pistolas de uso exclusivo da Polícia Militar, e atingiram a cabeça ou o tórax das vítimas.
Trata-se da maior chacina ocorrida no Estado. Outra vez, a suspeita recai sobre policiais militares. Digo outra vez porque as outras chacinas – de Vigário Geral, de Acari, de Nova Brasília e a ocorrida perto da igreja da Candelária – condenaram policiais militares.
Estive hoje com o Ministro da Justiça, que me disse que já há dez policiais presos pela Polícia Federal e identificados por testemunhas. Agora mesmo, estão sendo ouvidos no Rio de Janeiro.
Supostamente inconformados com a disciplina implantada pelo novo comandante do Batalhão de Caxias, no princípio da semana passada, assassinaram dois homens, deixando os corpos no terreno adjacente ao fundo do quartel e lançando a cabeça de um deles, por cima do muro, dentro do batalhão.
O Sr. Demóstenes Torres (PFL – GO) – V. Exª me permite um aparte, Senador Marcelo Crivella?
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL – RJ) – Pois não, Senador Demóstenes Torres.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL – RJ) – Pois não, Senador Demóstenes Torres.
Ouço o Senador Antonio Carlos Magalhães.
O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL – BA) – Há exatamente dez anos clamo para que se treine as Forças Armadas a fim de que elas ajudem a combater o crime no Brasil. Não adiantou. Sempre havia má vontade dos verdadeiros militares, os generais. Diziam que a tropa era só para invasões externas, para defender fronteira, enfim, para atuar em situações que nunca acontecem no Brasil, como guerra. Agora, na segurança pública há fatos novos todos os dias. O que se vê agora? As Forças Armadas são usadas para a saúde, mas, não são para a segurança pública. São treinadas para a saúde, mas, não são treinadas para a segurança pública. Agora, surgiu um batalhão que, segundo o Ministro da Justiça, vai atuar na terra de V. Exª, o Rio de Janeiro. Mas ainda é pouco. Há quase 300 mil homens nas Forças Armadas, e a atuação deles seria um auxílio muito grande ao nosso País. Tenho certeza de que o que deseja um homem, com os sentimentos de V. Exª, é que a população tenha segurança, é que a população não seja vítima de seqüestros, de furtos. Enfim, que haja tranqüilidade entre o povo brasileiro, o que não existe hoje em Estado nenhum, principalmente no Rio de Janeiro e em São Paulo.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL – RJ) – Sem dúvida, Senador Antonio Carlos Magalhães.
Mas quero dar uma boa notícia a V. Exª. O projeto de V. Exª, do qual tive a honra de ser relator, ano passado, aqui nesta Casa, já surtiu efeito. Nele, dávamos poder de polícia às Forças Armadas para atuarem nas fronteiras. Graças a Deus! Um batalhão de soldados de Infantaria, sem muita função em Niterói, foi transferido para as fronteiras de Peru, Colômbia e Bolívia, de onde vem toda a cocaína que vitima principalmente o meu Estado de São Paulo. Ninguém se inicia na vida do crime saindo de casa uma noite para matar trinta pessoas ou arrancar a cabeça de um sujeito e jogá-la dentro de um batalhão. Claro que essas pessoas cometeram crimes antes e não pagaram por eles.
A impunidade no Brasil é muito forte. Vivemos uma crise social e econômica sem precedentes, que leva ao crescimento de crimes e delitos. É tanta gente cometendo crimes e delitos ao mesmo tempo que se torna difícil investigar, processar, sentenciar e prender. Tamanha dificuldade provoca a sensação de impunidade mesmo. Graças a Deus, o Ministro da Justiça informou-me que os 10 policiais envolvidos estão sendo ouvidos. Eles já caíram em contradição e já foram identificados por testemunhas. Nós vamos prendê-los e levá-los à barra da lei. Deus é grande. A Justiça há de prevalecer.
Senador Demóstenes Torres, Senador Antonio Carlos Magalhães, vivemos uma crise moral, espiritual; uma crise econômica de longa data, não do atual Governo, causadora de profunda desigualdade na distribuição da renda. Essa desigualdade criou, por um lado, o consumo faustoso, perdulário, conspícuo de multimilionários, que descrevem com tanto encanto nas revistas especializadas: seus jatos, helicópteros, suas festas, suas mansões nababescas, verdadeiros palácios, com segurança privada. Tudo isso em meio a um oceano de barbárie, de violência que abriga outra parcela da população. Esta, abaixo da linha da pobreza: sem condições de habitação, higiene, saúde, de transporte e de segurança, como ficou provado agora no massacre da Baixada.
Ouvirei o Senador Flexa Ribeiro e, logo em seguida, V. Exª, Senador Romeu Tuma.
O Sr. Flexa Ribeiro (PSDB – PA) – Pois não, Sr. Presidente. Senador Marcelo Crivella, solidarizo-me com o povo fluminense diante da barbárie ocorrida. Corroboro as palavras do Senador Demóstenes Torres e Antonio Carlos Magalhães. A morte hedionda de trinta pessoas no Rio de Janeiro foi lamentada por toda a sociedade brasileira. Associo-me a V. Exª, por suas palavras, para lamentar o fato. V. Exª está nos dizendo que o fato já está sendo elucidado. Se fosse no meu Estado, o Pará, ao invés de ser trazido para a esfera federal, talvez fosse pedida uma intervenção federal. É lamentável, como mencionou o Senador Demóstenes Torres, que a questão da justiça, do policiamento na esfera federal esteja em situação precária.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL – RJ) – Concedo o aparte ao Senador Romeu Tuma.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL – RJ) – Vamos virar. Muito obrigado, Senador Romeu Tuma.
Concedo o aparte ao Senador Juvêncio da Fonseca.
O Sr. Juvêncio da Fonseca (PDT – MS) – Senador Marcelo Crivella, peço um minutinho apenas. Sei que estamos tomando seu tempo, acho que até o Presidente será tolerante com V. Exª, concedendo-lhe um tempo maior.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL – RJ) – Rogo a Deus.
O Sr. Juvêncio da Fonseca (PDT – MS) – A indignação nossa é a indignação da Nação brasileira, que não é capaz de entender questões como essa. O Senador Romeu Tuma tomou o meu discurso porque eu ia dizer justamente do corte, do bloqueio feito pelo Executivo ao Fundo Nacional de Segurança Pública em 58%! Mais da metade dos recursos para o Fundo Nacional de Segurança Pública foi bloqueado pelo Executivo. O que quer o Executivo? Que chacinas como essa se multipliquem? Que continuem a incompetência e a conivência da polícia com essa bandidagem? E como fica o povo brasileiro? Essa é a grande indagação, Senador Marcelo Crivella. Oportunamente V. Exª está tocando num assunto que é da indignação do País.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL – RJ) – Muito obrigado, Senador Juvêncio da Fonseca.
Senador Demóstenes Torres, vamos fundo nessa questão. Vamos analisar a parte sociológica, a nossa origem, a colonização deste País. As desigualdades se instalam e se enraízam desde os primórdios da colonização na situação subordinada do indígena, sujeito à escravidão, à incorporação cultural e ao extermínio; na discriminação contra o negro, o branco, o pobre e o mestiço; nos privilégios políticos e econômicos dos donatários hereditários e dos capitães gerais; na concessão da terra; na reserva das funções públicas aos portugueses; e no regime escravocrata. Assim, devido à forma como se organizou a propriedade da terra, o mercado de trabalho, com base na escravidão, e o poder político, foi se formando no Brasil uma macroestrutura de poder – que quero denunciar nesta Casa – constituída por grupos extraordinariamente minoritários que se beneficiam desse sistema de disparidades.
Sabe-se hoje, Sr. Presidente, que 80% da dívida pública está nas mãos de 7 mil famílias brasileiras; sete mil grupos econômicos são detentores de 800 bilhões de reais de um trilhão de reais em títulos que o Governo tem distribuído pelos bancos na sociedade. Senador Flávio Arns, país nenhum tem tamanha desigualdade! Da dívida pública brasileira que chegou a um trilhão de reais no ano passado, 800 bilhões estão nas mãos de 7 mil brasileiros que receberam de juros 111 bilhões.
Isso é culpa do Presidente Lula? De jeito nenhum. Isso vem das nossas raízes, isso vem de governos anteriores. E os outros 200 bilhões de reais, onde estão? Senador Augusto Botelho, os outros 200 bilhões pertencem a 10 milhões de brasileiros que têm lojas em shopping, pequenos comércios, pequenas indústrias; a proprietários rurais que estão exportando mais e que hoje têm um ou dois milhões; são artistas de televisão; jogadores de futebol que foram ganhar dinheiro no exterior. Esses 10 milhões de brasileiros têm hoje 200 bilhões aplicados nos bancos. Mas 800 bilhões pertencem a 7 mil brasileiros. E esses 7 mil brasileiros…
(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL – RJ) – Senador Flávio Arns, peço a V. Exª que tenha misericórdia e me dê um pouco mais de tempo, devido aos apartes ao discurso. (Pausa.) Muito obrigado, Sr. Presidente.
Esses 7 mil brasileiros provavelmente estão no grupo dos 10,522 milhões que, segundo a Receita Federal, possuem depósitos de 82 bilhões de dólares em bancos do exterior. Não estamos falando dos iates, das casas, das ações e do dinheiro que não encontramos. São 82 bilhões de dólares! Senador Demóstenes Torres! Aqui está o crime, aqui está a falta de dinheiro na segurança. Pagamos 111 bilhões de reais para 7 mil brasileiros no final do ano passado! Quanto investimos na saúde e na educação? Os recursos não chegaram perto desse montante. É isso que nos preocupa. Essa macroestrutura de poder vive acima do Presidente da República, dos Ministros, da Câmara e do Senado; ela se articula de maneira tão operacional que não se aprova nesta Casa qualquer lei que possa tocar nesse assunto.
Ora, por que o Presidente Lula e o Ministro Antonio Palocci não baixam as taxas de juros? Senador José Maranhão, isso não acontece porque a nossa elite, na medida em que a taxa baixa um, dois ou três pontos percentuais, vai trocar por dólar e enviar o dinheiro ao exterior. A conta é simples.
O Senador José Maranhão, grande Líder, ex-Governador da Paraíba, vai indagar por que não se faz uma conta de controle de capitais, pois vários países adotaram isso. Não podemos, temos contratos, fazemos parte do clube dos países neoliberais. O fluxo de capitais precisa ser livre. Ficamos escravos de uma desigualdade social que gera, por um lado, esse consumo faustoso, conspícuo e perdulário de pessoas que estão, eu diria, com a sua riqueza até saturada, enquanto milhões de brasileiros mal têm o que comer.
O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PL – RJ) – Sr. Presidente, solicito que meu discurso seja dado como lido. Mas fica aqui o clamor de um Senador, que, com tanta tristeza, no dia 31, assistiu à morte dos seus conterrâneos, irmãos, meninos que estavam jogando fliperama num bairro pobre, Senador Demóstenes Torres… Queimados é um bairro tão pobre! As calçadas estão quebradas, prédios pichados, ruas esburacadas. Meu Deus do Céu! Esse crime clama aos céus, mas clama também aos homens de boa vontade que eu sei que existem nesta Casa. É preciso que nos unamos ao redor do Presidente Lula, a fim de dar apoio a Sua Excelência para uma mudança séria na política econômica porque se não diminuirmos esse grau de desigualdade o Brasil não terá solução.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SR. SENADOR MARCELO CRIVELLA
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